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30/07/2021

Toxina estafilocócica

Tainá Drebes

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que anualmente 600 milhões de pessoas no mundo adoecem por ingestão de alimentos contaminados, sendo que destas, 420 mil vêm a óbito (1). Nos Estados Unidos, o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) estima que a cada ano, 48 milhões de americanos ficam doentes, sendo 128 mil hospitalizados e 3 mil morrem de doenças transmitidas por alimentos (2). No Brasil, segundo o Boletim Epidemiológico no 32, de agosto de 2020, a média anual de surtos de origem alimentar no período de janeiro de 2016 a dezembro de 2019 foi de 626, que acometeram 37.247 pessoas. Foram registrados 38 óbitos (média de 9,5 mortes ao ano) em 26 surtos, dos quais 23,1% tiveram os agentes etiológicos identificados como: intoxicação exógena, E. coli EHEC, S. aureus, T. cruzi e Salmonella spp. (3). Tanto nos surtos registrados nos Estados Unidos quanto no Brasil, Staphylococcus aureus aparece entre os cinco principais agentes etiológicos identificados.

Staphylococcus são bactérias Gram positivas, em forma de cocos, podendo se apresentar aos pares, em pequenas cadeias ou em formato de “cacho de uva”. São aeróbios facultativos, catalase positivos, imóveis, relativamente resistentes a baixa atividade de água, apresentando tolerância ao dessecamento e condições de alta salinidade (4;5). Crescem em meios de cultura com pH próximo ao neutro, de 24 a 48h, sendo 37,0°C sua temperatura ótima de crescimento (6). Estando amplamente distribuídas no ambiente (ar, água, alimentos e superfícies de contato com alimentos), muitas espécies do gênero são potencialmente encontradas nos alimentos devido à presença de reservatórios em humanos e animais saudáveis. Em humanos, o reservatório primário de S. aureus é a cavidade nasal, e cerca de 50% dos adultos são portadores. Espera-se que Staphylococcus estejam presentes em baixas contagens em quaisquer produtos alimentares diretamente manipulados por humanos ou que sejam de origem animal, desde que nenhum processo térmico tenha sido aplicado. Algumas espécies do gênero, tanto coagulase positiva quanto coagulase negativa, são capazes de produzir toxinas altamente estáveis ao calor, causando gastroenterite em humanos. S. aureus é o agente etiológico predominantemente associado a intoxicações alimentares, no entanto outras espécies também têm a habilidade de produzir enterotoxinas (4).

A intoxicação alimentar por Staphylococcus se dá pela ingestão de alimentos contaminados por enterotoxinas pré-formadas, e os sintomas, como diarreia, vômito, náuseas e cólicas abdominais, iniciam de 2 a 8 horas após a ingestão do alimento, podendo perdurar por 24 a 48 horas. Os alimentos geralmente relacionados à intoxicação alimentar estafilocócica são produtos lácteos, cárneos, aves, alimentos processados e produtos de panificação. Uma vez contaminado, se o alimento não for mantido em condições adequadas para impedir a multiplicação (refrigeração ou processos de calor que visem à redução de microrganismos), as bactérias poderão se multiplicar e também produzir as enterotoxinas (7). Enquanto os estafilococos podem ser destruídos por tratamento térmico, suas toxinas podem subsistir pois resistem a temperaturas elevadas.

Foram identificados sete tipos sorológicos distintos de enterotoxina estafilocócica (SE), que são designados pelas siglas SEA, SEB, SEC1, 2, 3, SED e SEE. Essas proteínas geralmente são produzidas pelo S. aureus, mas outras cepas coagulase positivas como S. intermedius e S. hyicus, também se revelaram enterotoxigênicas. Geralmente, as espécies coagulase negativa, como S. epidermidis, não produzem enterotoxinas, no entanto foi diagnosticada pelo menos uma intoxicação ligada a essa espécie. Por essa razão, os estafilococos coagulase negativa não podem ser ignorados se estiverem presentes em grande número nos produtos alimentares: é então necessário testar a sua propriedade de produzir enterotoxinas (7; 8).

A detecção de enterotoxinas nos alimentos foi inserida na Instrução Normativa no 60, de 23 de dezembro de 2019 (MS/ANVISA) (9), a qual estabelece as listas de padrões microbiológicos para alimentos, nas categorias Leite e Derivados, Suplementos e Alimentos Semielaborados e Prontos para o Consumo.

Em relação às doenças transmitidas por alimentos (DTA), as bactérias do gênero Staphylococcus são de grande relevância, estando geralmente relacionadas à má higienização das mãos de manipuladores, utensílios e superfícies de contato com alimentos, assim como falhas nas temperaturas de conservação (resfriamento) e produção/cocção dos alimentos (aquecimento). A manutenção das boas práticas e a conservação adequada dos alimentos são fatores que auxiliam a não multiplicação desses microrganismos e evitam a produção das enterotoxinas.

Referências:

(1) World Health Organization. Disponível em: https://www.who.int/NEWS-ROOM/FACT-SHEETS/DETAIL/FOOD-SAFETY. Acessado em 12/07/2021.

(2) Centers for Disease Control and Prevention. Estimates of Foodborne Illness in the United States. Disponível em: https://www.cdc.gov/foodborneburden/2011-foodborne-estimates.html. Acessado em 12/07/2021.

(3) MINISTÉRIO DA SAÚDE. Secretaria de Vigilância em Saúde. Boletim Epidemiológico no 32, volume 51, de agosto de 2020. Disponível em: https://antigo.saude.gov.br/images/pdf/2020/August/17/Boletim-epidemiologico-SVS-32.pdf. Acessado em 12/07/2021.

(4) BENNETT, Reginald W.; HAIT, Jennifer M.; TALLENT, Sandra M. In: Staphylococcus aureus and Staphylococcal Enterotoxins. Compendium of Methods for the Microbiological Examination of Foods. 5th Edition. APHA PRESS. Washington, DC, 2015.

(5) Brock, T., Madigan, M., Martinho, J., & Parker, J. Microbiologia de Brock. 10a Edição. Prentice Hall. São Paulo, 2010.

(6) ISO 6888-1:1999/Amd 1:2003 – Microbiology of food and animal feeding stuffs – Horizontal method for the enumeration of coagulase-positive staphylococci (Staphylococcus aureus and other species) – Part 1: Technique using Baird-Parker agar medium: Inclusion of precision data.

(7) Bacteriological Analytical Manual. Authors: Sandra M. Tallent, Reginald W. Bennett and Jennifer M. Hait. BAM Chapter 13B - Staphylococcal Enterotoxins Detection Methods. Disponível em: https://www.fda.gov/food/laboratory-methods-food/bam-chapter-13b-staphylococcal-enterotoxins-detection-methods. Acessado em 13/07/2021.

(8) VIDAS® Staph enterotoxin II (SET2). Biomeriéux. Ref: 30 705. 12095 I - en - 2015/01. Disponível em: https://www.mediray.co.nz/media/15788/om_biomerieux_test-kits_ot-30705_package-insert-vidas-staph-enterotoxin-ii-set-2.pdf. Acessado em 13/07/2021.

(9) BRASIL. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Instrução normativa no 60, de 23 de dezembro de 2019. Estabelece as listas de padrões microbiológicos para alimentos. Diário Oficial da União. 2019.

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