Um estudo recente realizado no bioma Pampa, no Sul do Brasil, por pesquisadores da Universidade do Vale do Taquari - Univates trouxe à tona dados reveladores sobre a diversidade e a heterogeneidade das florestas ribeirinhas, também conhecidas como matas de galeria.
Essas florestas, localizadas em áreas próximas a rios e riachos, apresentam uma diversidade florística impressionante, mesmo quando os fragmentos estão relativamente próximos uns dos outros. A pesquisa comparou três remanescentes florestais ribeirinhos na região do Vale do Taquari, com o objetivo de verificar se esses fragmentos mantinham a alta diversidade florística e estrutural, características dessas formações vegetais.
A pesquisa é assinada por Carla Roberta Orlandi, Vinícius Leão da Silva, Maicon Toldi, Marelise Teixeira e Elisete Maria de Freitas, pesquisadores vinculados aos Laboratórios de Botânica e de Acarologia e ao Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia (PPGBiotec) da Univates, e foi financiada pela CMPC Celulose Riograndense por meio de um convênio firmado com a Universidade. O estudo está publicado no periódico científico Acta Botanica Brasilica.
Como o estudo foi feito?
Os pesquisadores estabeleceram 81 unidades amostrais, distribuídas ao longo das margens de três córregos. Em cada uma das unidades amostrais foram obtidas as medidas de circunferência à altura do peito (CAP) e a altura total de todos os indivíduos arbóreos e arbustivos cuja CAP era igual ou superior a 15 cm. Com esses dados foi possível descrever a composição florística (lista das espécies) e a estrutura da comunidade vegetal (definição de espécies dominantes, de maior densidade e frequentes).
Considerando diferentes variáveis da comunidade vegetal, obtidas com a amostragem e espessura da serapilheira, também foi definido o estágio sucessional em que se encontravam. Ao todo, foram registrados 1.659 indivíduos vivos, distribuídos em 67 espécies e 34 famílias botânicas. Os resultados confirmaram a alta heterogeneidade das florestas ribeirinhas, demonstrando que, apesar da proximidade, os fragmentos diferem significativamente em termos de riqueza e estrutura.
Um dos remanescentes destacou-se pela predominância de espécies e de indivíduos pioneiros, aqueles que colonizam áreas degradadas e toleram maior exposição ao sol. São plantas que modificam o ambiente, proporcionando condições para que as espécies secundárias possam se instalar. Esse fragmento diferenciou-se dos outros dois, que, por sua vez, apresentaram maior similaridade na composição florística, com a predominância de espécies secundárias e tardias, aquelas que ocupam áreas já estabilizadas ao longo do tempo. O estudo também sugere que a permanência do fragmento em estágio secundário mais inicial é ocasionada pelo seu tamanho, que é menor, e pelo formato mais estreito. Essas características aumentam os efeitos de borda, ou seja, as influências do ambiente externo na área interna do fragmento.
As florestas ribeirinhas são formações vegetais complexas e altamente heterogêneas, afetadas tanto por fatores bióticos, como a presença de diferentes espécies, quanto abióticos, como temperatura, luminosidade e umidade do solo. No estudo, a variação na umidade do solo entre os fragmentos foi um dos fatores que mais influenciou a diversidade observada. Por exemplo, o fragmento com solo mais úmido apresentou maior presença de espécies adaptadas a essas condições, como Gymnanthes klotzschiana, uma espécie típica de ambientes alagados.
O bioma Pampa, que se estende pelo Brasil (Rio Grande do Sul), Argentina e Uruguai, é conhecido por sua rica diversidade de espécies. No entanto, essa biodiversidade está sob constante ameaça devido à expansão da agricultura e da silvicultura, além do uso indiscriminado de herbicidas e da invasão por espécies exóticas. A fragmentação das áreas florestais ribeirinhas, em particular, tem levado à perda de biodiversidade e à redução da heterogeneidade do habitat.
As florestas ribeirinhas desempenham papel crucial na conservação da biodiversidade, protegendo as margens dos cursos d'água e oferecendo abrigo e alimento para diversas espécies. Contudo, a pequena extensão dos fragmentos e sua proximidade com áreas de monocultura, como as plantações de Eucalyptus saligna, ameaçam essa função ecológica. A pesquisa identificou que, embora pequenos e cercados por monoculturas, os remanescentes ainda mantêm uma significativa heterogeneidade e são fundamentais para a conservação das espécies locais.
Os resultados do estudo ressaltam a importância de preservar esses remanescentes florestais, não apenas por sua alta diversidade, mas também pelo papel que desempenham na manutenção da saúde ecológica do bioma Pampa. Além disso, destacam a necessidade de políticas de conservação que levem em conta a conectividade entre fragmentos florestais e a criação de novas áreas protegidas, a fim de mitigar os efeitos da fragmentação e promover a conservação de longo prazo dessas valiosas formações vegetais.