O Vale do Taquari, uma região situada no Rio Grande do Sul, Brasil, tem se destacado como um destino significativo para imigrantes internacionais, especialmente do Sul Global, desde 2010 (até 2019). Um novo estudo publicado analisa como a chegada desses imigrantes tem impactado a estrutura econômica e a divisão territorial do trabalho na região, com foco particular na cidade média de Lajeado e em seu papel no contexto regional.
O estudo é assinado por Rosmari Terezinha Cazarotto, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do RS (IFRS); Fernanda Cristina Wiebusch Sindelar e Marcia Solange Volkmer, da Universidade do Vale do Taquari - Univates; Rogério Leandro Lima da Silveira, da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc); e Carolina Rezende Faccin, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs). A pesquisa pode ser consultada neste link, publicada na revista científica Desenvolvimento em Questão.
Historicamente, o Vale do Taquari é conhecido por seu desenvolvimento agroindustrial e suas cadeias produtivas associadas, especialmente no setor de carnes. A chegada de imigrantes internacionais, predominantemente haitianos, trouxe novas dinâmicas para a região, destacando-se pela integração desses indivíduos nos mercados urbanos de trabalho e a transformação das paisagens urbanas locais.
Imigração e trabalho
O conceito de socioterritorialidade é fundamental para entender como a integração dos imigrantes se dá não apenas na escala da cidade, mas também na rede urbana regional. Lajeado, a cidade média central no estudo, tem se tornado um ponto focal para a presença e o trabalho dos imigrantes internacionais.
Aproximadamente 46% (3.004) dos imigrantes que chegaram à região se estabeleceram em Lajeado, o que reflete a importância econômica e social da cidade na acomodação e integração desses novos habitantes. Outras cidades como Encantado, Estrela e Arroio do Meio também receberam um número considerável de imigrantes, refletindo a proximidade das cidades e a interconexão das atividades econômicas.
Os imigrantes internacionais que chegaram ao Vale do Taquari entre 2010 e 2019 são, em sua maioria, originários do Sul Global, com 67% deles sendo haitianos. Essa mudança demográfica contrasta com o perfil dos imigrantes que chegaram antes de 2010, quando a maioria era de origem europeia. O primeiro haitiano registrado em Lajeado chegou em 2010 e, desde então, o número de imigrantes haitianos tem aumentado.
Os haitianos, amparados pela Resolução Normativa nº 97, de 2012, do Conselho Nacional de Imigração (CNIg), obtiveram o visto humanitário, que facilitou sua integração ao mercado de trabalho. No entanto, críticas apontam a falta de políticas públicas eficazes para garantir a plena inclusão e os direitos dos imigrantes no Brasil.
A falta de mão de obra local em setores específicos, como o de frigoríficos e a construção civil, levou os dirigentes locais a recrutar inicialmente imigrantes haitianos, que aceitavam vagas consideradas menos atrativas pelos trabalhadores locais devido às condições de trabalho e remuneração.
Economia e imigração
A região do Vale do Taquari é uma das quatro áreas do Estado do Rio Grande do Sul que mais contrata imigrantes internacionais formalmente, conforme dados de 2019. As indústrias de transformação associadas às cadeias agroalimentares são as principais empregadoras desses trabalhadores. A região conta com 12 frigoríficos, o que demonstra a alta concentração de infraestrutura tecnológica voltada para o setor de carnes. Mais de 80% dos imigrantes internacionais estão empregados formalmente nesses setores, refletindo a demanda contínua por mão de obra.
O crescimento da produção de suínos e galináceos na região, que aumentou nas últimas décadas, acompanhou o crescimento dos fluxos migratórios. A produção de suínos cresceu 114% e a de galináceos, 1.320% desde 1974, refletindo a expansão das capacidades produtivas da região e a demanda crescente por trabalho.
Migração contemporânea
Os fluxos migratórios contemporâneos diferem dos anteriores, com uma tendência de busca por inserção nas dinâmicas urbanas, e não mais apenas nas atividades rurais. A chegada de imigrantes haitianos trouxe novas perspectivas e desafios para a integração urbana e econômica na região.
O papel de Lajeado como centro de concentração de imigrantes é evidenciado pela sua importância na dinâmica do trabalho e na vida social desses indivíduos. A cidade se destaca não apenas como um local de emprego, mas também como um ponto central para a construção de comunidades imigrantes e a formação de redes sociais e econômicas.
Desafios
Apesar das contribuições dos imigrantes para a economia regional, eles enfrentam desafios como a marginalização social e dificuldades econômicas, exacerbadas pela crise econômica observada nos últimos dez anos e pela desvalorização da moeda brasileira. A manutenção de salários baixos e dificuldades em enviar recursos para suas famílias de origem são problemas recorrentes.
O estudo revela que os imigrantes internacionais têm se integrado profundamente à vida no Vale do Taquari, dinamizando a economia e a sociedade local. Além de trabalhar, muitos estão estabelecendo famílias e realizando investimentos como a compra de carros e casas, o que demonstra uma tentativa de se estabelecer na região em longo prazo.