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Pesquisa investiga desastre de Mariana e a luta da comunidade de Regência (ES) por justiça e reparação

Postado as 13/06/2024 11:50:24

Por Lucas George Wendt

Em novembro de 2015, o rompimento da barragem de Fundão da Samarco em Mariana, Minas Gerais, causou um dos maiores desastres socioambientais da história do Brasil. A lama tóxica devastou o Rio Doce, afetando comunidades ribeirinhas a centenas de quilômetros de distância, incluindo Regência, distrito da cidade de Linhares, no Espírito Santo.

Warner Di Francesco Belém, pesquisador capixaba, dedicou-se a investigar os impactos do desastre na comunidade de Regência e as lutas dos moradores por justiça e reparação durante sua tese de doutorado realizada no Programa de Pós-Graduação em Ambiente e Desenvolvimento da Universidade do Vale do Taquari - Univates. Sua pesquisa, realizada entre 2020 e 2023, utilizou métodos qualitativos e quantitativos, incluindo entrevistas, observações e análise documental. O estudo foi orientado pela professora doutora Luciana Turatti. 

Segundo o instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - Ibama, o rastro de dejetos poluiu 663,2 km de cursos d’água, atingiu dezenas de municípios, devastou localidades e, consequentemente, desagregou os vínculos sociais das comunidades, desalojou e trouxe a sensação de perigo e desamparo à população.

Por meio de sua pesquisa, Warner revelou os impactos duradouros do desastre na vida dos moradores de Regência. A pesca, principal atividade econômica da comunidade, ainda está proibida devido à contaminação do rio. A lama tóxica também contaminou o solo e a água potável, colocando em risco a saúde da população. Além disso, o desastre causou danos psicológicos e sociais, com a perda de identidade cultural e o sentimento de insegurança e desamparo.

“Este evento leva a uma multiplicidade de reflexões sobre os riscos da Modernidade, pois fragmentou o distrito de Regência, desencadeando a perda da identidade, referências tradicionais, culturais, religiosas e de lugar, ocasionando transtornos aos seus valores intrínsecos e intangíveis”, descreve o pesquisador. 

Os moradores de Regência têm travado uma batalha por justiça e reparação, cobrando da Samarco e do governo brasileiro medidas efetivas para compensar os danos causados e garantir a sua qualidade de vida. A pesquisa documenta as diversas formas de resistência da comunidade, incluindo protestos, ocupações e ações judiciais.

A luta da comunidade de Regência é um exemplo da luta por justiça ambiental. O estudo oferece uma análise valiosa dos desafios e das perspectivas dessa luta. Ele destaca a importância de se considerar as particularidades de cada comunidade impactada por desastres socioambientais e de se garantir a participação social nos processos de reparação.

Com a pesquisa, Warner faz um alerta para os riscos da exploração desenfreada dos recursos naturais e da necessidade de se construir um modelo de desenvolvimento mais justo e sustentável. A luta da comunidade de Regência por justiça e reparação ainda está em curso. 

Mudança necessária 

“Na contemporaneidade, a natureza é normalmente lembrada quando ela freia nossos desejos de consumo. Seja por uma escassez de matéria-prima ou pelas consequências das ações humanas que impactam a rotina do consumo hedonista. Para a comunidade ribeirinha de Regência, a natureza é parte essencial da vivência de cada morador. O prazer e as lembranças estão intimamente ligados ao rio. Um almoço em família, um pedido em casamento, o lazer, um ofício e até mesmo a concepção de uma criança”, observa o pesquisador. 

“Ao perceber essa grande diferença, o trabalho conseguiu identificar que não é plausível uma reparação, digamos, monocromática e cartesiana. Uma reparação feita de forma igual para todos sem consideração de suas particularidades e a individuação dos atingidos. O que pretendemos dizer com isto é evidenciar que cada comunidade possui sua particularidade e sua realidade e não pode ser vista como apenas um número”, diz Warner. 

Nessa direção, “os projetos de reparação estão tratando as localidades como se fossem uma única extensão e não estão considerando e muito menos ouvindo o que as pessoas mais vulneráveis e impactadas pelo desastre precisam. Este é o ponto crucial. Observam-se apenas os danos materiais e o que não conseguem tabular em uma matriz é desconsiderado. Esse é o grande erro e que está, ano a ano, esfacelando a comunidade ribeirinha de Regência”, pontua o pesquisador. 

Recomendações

A partir dos resultados da pesquisa, Warner propõe algumas medidas para garantir a justiça e a reparação para a comunidade de Regência:

- implementação de um plano de reparação integral, que leve em consideração os danos materiais e imateriais causados pelo desastre;

- apoio ao desenvolvimento de atividades econômicas alternativas à pesca, que sejam compatíveis com a preservação ambiental;

- investimentos em infraestrutura e serviços públicos na comunidade;

- garantia do acesso à água potável e à saúde de qualidade;

- promoção de ações de educação ambiental e valorização da cultura local;

- estímulo à participação social nos processos de tomada de decisão.

Warner continuará investigando o tema. “A proposta é continuar aprofundando os estudos e erguendo ainda mais a bandeira dos impactados. Esse conhecimento construído com várias mãos, sentimentos e lágrimas será disponibilizado à comunidade local, bem como ao Ministério Público. Há o desejo de transformar a tese em um livro, o que daria uma visibilidade ainda maior, ajudando a ecoar a necessidade de ouvir essas pessoas que possuem aspirações relacionadas com o Ser e o rio Doce”, informa. 

 

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