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Pesquisa

Pesquisadora lajeadense realiza estudos pioneiros na Antártica e na Patagônia

Por Lucas George Wendt

Postado em 09/08/2022 13:55:09


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Divulgação/INACH

Paisagens de tirar o fôlego e ricas em história sobre o passado da Terra são, atualmente, companhia constante da paleontóloga lajeadense Joseline Manfroi, graduada em Ciências Biológicas pela Universidade do Vale do Taquari - Univates e doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Ambiente e Desenvolvimento (PPGAD). No momento, a pesquisadora lidera estudos sobre paleoincêndios e mudanças climáticas na Antártica e na Patagônia no Instituto Antártico Chileno (Inach), em Punta Arenas, cidade que é considerada a porta de entrada para a Antártica. 

A cientista foi pioneira nos estudos sobre a ocorrência de paleoincêndios vegetacionais durante o Cretáceo nos ambientes austrais da Península Antártica, em um tempo geológico em que o continente atualmente branco e coberto de neve ainda era verde, tomado por grandes florestas e habitado por diversos organismos, entre eles aves, dinossauros e primeiros mamíferos. Esses ambientes eventualmente eram consumidos pelo fogo, assim como ocorre em muitas partes do globo na atualidade.

Divulgação/INACH



Os estudos desenvolvidos pela Dra. Joseline em seu pós-doutorado colaboram para agregam informações em projetos de pesquisa realizados em distintas instituições, entre elas o Laboratório de Paleobotânica e Evolução de Biomas do Museu de Ciências da Univates e o Centro de Polar e Climático da Universidade da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), instituição em que a pesquisadora é colaboradora. 

O projeto de pesquisa conduzido por Joseline é fomentado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), e seu trabalho tem gerado uma importante conexão de pesquisas entre o Chile e o Brasil na área da paleontologia. A pesquisadora está, desde fevereiro deste ano, coletando materiais e estudando incêndios florestais e mudanças ambientais e climáticas que aconteceram na região há 145 milhões de anos. 

Divulgação/INACH



No início de 2022, juntamente com uma equipe composta por paleontólogos com diferentes especialidades do Inach e da Universidad de Chile, liderada pelos paleontólogos Dr. Marcelo Leppe e Dr. Alexander Vargas, Joseline participou de uma expedição científica paleontológica na região de Magalhães, na Antártica Chilena, com o objetivo de realizar prospecção de material fossilífero para seus estudos. 

Joseline afirma que “com base na análise dos fósseis carbonizados coletados durante a expedição, será possível realizar importantes interferências paleoambientais, que hoje representam uma significativa lacuna de informações a ser preenchida para permitir uma melhor compreensão da dinâmica das mudanças ambientais e climáticas nessas áreas do globo”. 

A pesquisadora também comenta que “a abrangência da cooperação internacional é essencial para o desenvolvimento dessa área do conhecimento e fortalece e fomenta ainda mais as relações científicas e a internacionalização da ciência produzida por brasileiros”, já que seu trabalho mobiliza diferentes instituições no Brasil e no Chile.

Divulgação/INACH



Em busca de respostas 

Há dez anos, Joseline teve o primeiro contato com o Instituto Antártico Chileno, participando de um simpósio da Associação de Jovens Pesquisadores Polares (Apecs/Brasil), da qual ela faz parte. Foi nessa ocasião que conheceu os trabalhos desenvolvidos pelo Inach e, no mesmo ano, a pesquisadora teve a oportunidade de conhecer pessoalmente o instituto ao participar do Congresso de Paleontologia do Chile em 2012, juntamente com sua orientadora de mestrado, Dra. Tânia Lindner Dutra.

Os temas de pesquisa de Joseline são pioneiros, havendo atualmente apenas dois trabalhos publicados sobre a área específica que ela estuda ‒ sendo o primeiro deles, o seu, de 2015, que apresenta o primeiro registro de paleoincêndios na Antártica durante o período Cretáceo (último período da Era Mesozoica, compreendido entre 144 milhões e 66,4 milhões de anos atrás). 

Seu artigo intitulado “The first report of a Campanian palaeo-wildfire in the West Antarctic Peninsula” foi publicado na revista Palaeogeography, Palaeoclimatology, Palaeoecology.

A proposta inicial da paleontóloga era pesquisar os paleoincêndios na Antártica, e hoje ela se vê ampliando o foco do trabalho, também, para a Patagônia. “Os estudos que estamos realizando têm grande importância pois, na atualidade, a Patagônia é assombrada por muitos episódios de incêndios florestais. E é muito promissor olhar para o passado para compreender o presente e também fazer projeções para o futuro. A vantagem de se trabalhar com fósseis vegetais é que as plantas, enquanto vivas, vão alterando suas estruturas morfoanatômicas de acordo com as mudanças ambientais e climáticas que ocorrem no ambiente em que habitam, e essas alterações em sua anatomia ficam preservadas no registro fossilífero”.

“Olhar para a estrutura das plantas fósseis é como abrir uma janela para o passado, visualizando as condições ambientais e climáticas de uma determinada região do globo há milhões de anos”, afirma Joseline.

Quando questionada sobre a sua trajetória profissional, a paleontóloga comenta: “Enxergo hoje a história da minha caminhada profissional como a soma de muitos movimentos ao longo de muitos anos. Nada se constrói do dia para a noite, mas, sim, com a continuidade de movimentos e esforços individuais e coletivos compartilhados, e quando falo coletivos incluo minha família, amigos, alunos, companheiros de pesquisa e professores”.

“Tenho orgulho de pensar que minha história não é só minha, e sim de muitos! Na verdade, ela envolve muitos personagens: todos aqueles que vieram antes de mim, que caminharam comigo, e todos os que ainda estão por vir, que darão continuidade à produção de conhecimento na área das geociências”.

“Recebo muitas mensagens de pessoas que me acompanharam em alguma etapa da minha jornada, que me escrevem que hoje se sentem aqui comigo, e isso é muito bacana! Poder trazer até ‘o fim do mundo’ o nome de Lajeado, das pessoas que construíram o meu trabalho comigo e das instituições com as quais tenho vínculo é motivo de muita alegria para mim”, complementa Joseline. 

A experiência de participar de expedições de campo, coletar materiais e informações em situações extremas, diferentes das experiências de campo no Brasil, por exemplo, é algo desafiador para qualquer pesquisador. Joseline relata que já viveu situações em condições climáticas adversas, como calor, frio, chuva, neve e muito vento, mas se diz honrada em ter a oportunidade de estar pesquisando e atuando nesta área do conhecimento, as geociências, campo científico predominante masculina. “Aprendo e ensino aqui. É sempre uma troca”.  

Com seu trabalho, a cientista espera poder contribuir para a ciência e para a sociedade. “Pretendo preencher uma lacuna importante que existe atualmente na ciência sobre a dinâmica dos paleoincêndios na Patagônia e na Antártica ‒ a região mais austral do mundo ‒ durante o período Cretáceo, que temporalmente coincide com a extinção dos dinossauros. Sendo assim, é fundamental compreender o que aconteceu antes e depois desse evento”, explica.

Divulgação/INACH



Pesquisadoras no fim do mundo 

A estadia da pesquisadora no Chile também foi retratada na série “Científicas en el fin del mundo”. O documentário foi lançado pelo Conselho de Monumentos Nacionais do Chile e coordenado pelo paleontólogo José Pérez Marín. A obra tem como objetivos divulgar a ciência desenvolvida pelo olhar e pelas mãos de mulheres e encorajar uma nova geração de meninas e mulheres cientistas a ingressarem em campos como as geociências. Os episódios apresentam cinco mulheres pesquisadoras, que desenvolvem trabalhos na região mais austral do Chile. 

Passos anteriores da pesquisadora 

Joseline dedica-se à pesquisa científica desde o início da graduação, atuando como bolsista de iniciação científica, tendo sido orientada pelo professor Dr. André Jasper, professor permanente do PPGAD e coordenador do Laboratório de Paleobotânica e Evolução de Biomas da Univates, e pelas professoras Dra. Tânia Linder Dutra (da Universidade do Vale do Rio dos Sinos ‒ Unisinos) e Dra. Margot Guerra-Sommer (Ufrgs). Em 2016 Joseline alcançou distinção pela pesquisa inédita desenvolvida nesta área do conhecimento, recebendo a premiação como Pesquisadora Destaque na categoria Melhor Artigo Internacional pela Unisinos, pela publicação do trabalho pioneiro para Antártica. 

Atuação no Florantar

Desde 2021 Joseline compõe a equipe de pesquisadores do Projeto Florantar, do Programa Antártico Brasileiro (Proantar). Florantar ‒ Paleofloras da Península Antártica é um macroprojeto que reúne mais de 30 anos de experiência em pesquisas paleontológicas na Península Antártica. Ele tem como principal missão conhecer e estudar as floras fósseis da Antártica e suas conexões, visando à aplicação do conhecimento gerado no entendimento de processos geológicos, evolutivos da paisagem, alterações tectônicas e climáticas ao longo do tempo. O projeto é desenvolvido por uma equipe de cientistas brasileiros e estrangeiros, sendo coordenado atualmente pelo professor Dr. Marcelo Araújo Carvalho (Museu Nacional do Rio de Janeiro/Universidade Federal do Rio de Janeiro).

Reprodução/Google Earth

O Inach

O Inach, onde atualmente Joseline realiza suas pesquisas, é um órgão do Ministério das Relações Exteriores do Chile com autonomia em relação aos assuntos antárticos de natureza científica, tecnológica e de divulgação científica. O Instituto cumpre a Política Nacional Antártica do Chile incentivando o desenvolvimento de pesquisas de excelência, participando efetivamente do Sistema do Tratado Antártico e de fóruns relacionados, fortalecendo Magalhães como porta de entrada para o continente branco e realizando ações para disseminar o conhecimento antártico para os cidadãos do Chile e demais países. 

Divulgação/INACH

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