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II Seminário do Comung discute a nova sala de aula

Postado em 17/08/2013 12h32min

Por Elise Bozzetto

Sob o olhar atento de mais de duzentos professores, cinco painelistas apresentaram a possibilidade de uma nova educação. Uma educação inclusiva, plural, de qualidade, interativa e globalizada. 
 
Com o tema “Em uma época de mudanças, como fica a sala de aula?” o Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas (Comung) realizou nos dias 15 e 16 de agosto a segunda edição do Seminário do Comung. Palestrantes renomados debateram sobre inovação, metodologias ativas e  internacionalização no ensino superior. O evento, sediado na Univates, em Lajeado, contou com a participação de mais de duzentos professores, gestores e dirigentes de diversas instituições de ensino superior do RS e outros estados. 
 
Um dos debates centrais do seminário foi o uso de metodologias ativas de aprendizagem. Ph.D em Física pela Universidade de Nottingham, Álvaro José de Magalhães Neves passou um ano nos Estados Unidos para se especializar no método Peer Instruction, desenvolvido em Harvard. Ao aplicar a metodologia no Brasil verificou que o índice de aprendizagem supera significativamente o uso de métodos tradicionais, como aulas expositivas. O estudo de Neves, realizado em 2011, mostrou que na disciplina de Física básica, que tinha média de reprovação de 40% dos estudantes, o uso do método aumentou a aprovação para 67%. Neves justifica que numa exposição contínua a atenção do ouvinte cai 50% depois de 8 minutos, por isso a pouca eficácia do método “aulístico” de ensino. O Peer Instruction defende o uso de estudo prévio dos alunos, verificado por breve teste no início da aula, exposição do conteúdo por parte do professor por 7 a 10 minutos e aplicação de teste conceitual. Conforme a porcentagem de acertos é feita nova exposição, discussão em grupo ou novo ciclo do método. Para o pesquisador, o método permite um feedback constante e o aluno “aprende a aprender” da fonte, uma vez que para esta metodologia o estudo prévio é essencial. “Precisamos formar pessoas intelectualmente livres, que saibam aprender das fontes”, declara. Neves também utilizou um dispositivo chamado clicker para demonstrar como o uso de tecnologias pode auxiliar em sala de aula. “Com o clicker é possível acompanhar em tempo real a porcentagem de acerto dos alunos, fazer relatórios individuais ao longo do semestre e obter informações sobre o aluno e seu aprendizado. Mudar práticas de ensino não é um processo racional, requer persistência e disponibilização de recursos, principalmente tempo. A tecnologia pode ajudar no processo ensino aprendizagem, mas não é em si uma solução”, comenta.
 
Também discutiu metodologias ativas o Pós-Doutor pelas Universidades de Stanford (EUA) e Barcelona (ESP), Ulisses Ferreira de Araújo. O pesquisador demonstrou o método Aprendizagem baseada em problemas por projetos (ABPP), aplicado nos cursos de Engenharia da Usp. Para ele os desafios da educação são manter a acessibilidade e equidade sem perder a qualidade. A democratização do ensino, absorvendo alunos com diferenças econômicas, sociais, psíquicas, culturais, mudou a sala de aula, que deixou de ter alunos homogêneos mas continuou ao longo da história utilizando uma metodologia estruturada para atender um público homogêneo. A ABPP é uma estratégia pedagógica que apresenta aos estudantes situações significativas e contextualizadas com a realidade deles. O professor passa a ser um mediador da aprendizagem com recursos, orientação e instrução na medida em que os estudantes desenvolvem seus conhecimentos e habilidades na resolução de problemas. Os projetos problema são estudados de forma coletiva e colaborativa e não individualmente. “A Universidade não forma para o mundo do trabalho, para o mundo real, pois ensina a resolver problemas individualmente. Hoje as profissões trabalham por projetos e de forma coletiva. Essa nova forma de pensar o ensino traz a abertura para o novo, a perspectiva de uma ação voltada para o futuro, ou seja, transformadora, visando transformar a realidade”, explica. 
 
Outro tema debatido foi a internacionalização do ensino superior. Para o Ph. D da Universidade de Tel Aviv, Israel e docente da Unicamp, Leandro Russovski Tessler, o Brasil é um país monoglota, o que dificulta o envolvimento global. “Um exemplo é o programa Ciência sem fronteiras, no qual as universidades mais procuradas são as portuguesas ou espanholas. Na escolha não é levada em consideração a qualidade do ensino da área do aluno. O aluno opta pela língua”, frisa. Além disso, os currículos dos cursos de engenharia não são compatíveis para intercâmbio. “Nossos cursos possuem uma especialização precoce, excesso de disciplinas específicas e pouco ou nenhum estímulo para a inovação e pesquisa. A inovação deveria ser parte fundamental da formação, assim como o domínio da língua estrangeira. Só assim podemos fomentar de fato o intercâmbio, a interculturalidade, trazer professores estrangeiros para nossas instituições, oferecermos duplo-diploma”, defende. Conforme Tessler, o país não será relevante com uma cultura excludente.
 
Reforçando os problemas por trás da internacionalização, o Ph.D. em Epidemiologia e professor da Universidade Federal da Bahia, Naomar Monteiro de Almeida Filho trouxe as inovações acadêmicas recentes no mundo e no Brasil. Praticamente todos os modelos educativos adotados no mundo se adaptaram a um modelo internacional protagonizado pelos EUA (modelo College) e Europa (Modelo de Bolonha), no qual o ensino superior possui uma formação básica (uma espécie de bacharelado interdisciplinar), uma formação profissional mais específica e enfim a pós-graduação. “Nosso modelo só existe no Brasil, não é compatível com outros, o que dificulta o reconhecimento de cursos. O Brasil é um dos poucos países no mundo onde o diploma tem menção à profissão do sujeito”, enfatiza. Para o palestrante, mudar a estrutura de ensino é fundamental para formar os profissionais e cidadãos que hoje a sociedade precisa e demanda. “O desafio é formar um sujeito crítico, interdisciplinar e multicultural. E o desafio não é só esse, é fazer isso em larga escala e sem elitismo. Como popularizar sem vulgarizar, massificar sem perder a qualidade? Precisamos de um resgate da educação cultural. A universidade não serve apenas para formar profissionais mas para cumprir uma função de educação e formação cultural”, completa.
 
Doutor em Educação pela USP, Celso dos Santos Vasconcellos argumenta que uma nova gestão da sala de aula é necessária. “Um dos grandes problemas é que falamos muito na necessidade do aluno se adaptar ao mundo, o que é razoável, mas esquecemos de falar em transformar o mundo. Um outro mundo é possível”, afirma. Para ele, entender a alma humana é um dos maiores desafios do professor. “O vínculo é fundamental para a gestão da sala de aula. A paixão é o que há de mais poderoso no ser humano e a constituição do estudante é o desejo de aprender. O que constitui o mestre não é um diploma e sim a vontade de ensinar, o prazer em ver o outro crescer com sua ajuda, seu conhecimento. O que falta hoje em dia não são recursos, falta desejo, curiosidade e a principal ferramenta na sala de aula e na gestão é a formação de vínculos”. Para ele, há uma distorção na formação do mestre que passa a ter a centralidade no domínio do conteúdo e não na relação pedagógica e na competência de ensinar. A valorização estaria calcada nos conhecimentos técnicos. 
 
As apresentações dos palestrantes estarão disponíveis na íntegra a partir da próxima semana no site www.comung.org.br, no link downloads. Mais informações pelo e-mail comung@comung.org.br.
 
 
Texto: Elise Bozzetto
 
Celso dos Santos Vasconcellos argumenta que uma nova gestão da sala de aula é necessária

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Mais de 200 professores participaram do evento

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Presidente do Comung e Reitor da Univates, Ney José Lazzari

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Mais de 200 professores participaram do evento

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Para Neves, o aluno não deve ser um simples aplicador de fórmulas

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Ulisses Araújo debateu sobre novas metologias de ensino

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Jantar realizado na noite da quinta-feira integrou os participantes

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Para o Ph. D da Universidade de Tel Aviv, Israel e docente da Unicamp, Leandro Russovski Tessler, o Brasil é um país monoglota

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