2021 – 2024

A aula como criação: interfaces com a docência, o ensinar e o aprender

 

Com início em 2021, o Grupo CEM procura investigar a aula, na relação com a docência e com os processos de ensinar e aprender, tomando-a enquanto prática de criação. Intitulado “A aula como criação: interfaces com a docência, o ensinar e o aprender”, o qual busca expandir e aprimorar o olhar para a aula, a docência e os processos de ensinar e aprender – elementos que configuram a prática de um currículo.

Em relação à aula, trata-se de tomá-la como um modo de pensar/fazer, a partir de uma prática de criação. Mas, o que seria pensar e fazer uma aula perspectivada pela criação? Como se configura uma aula enquanto prática de criação, em meio aos processos de ensinar e de aprender?

Tomaremos aqui três dimensões de uma aula: a) aula como um conjunto de conteúdos programáticos a ser ensinados, espaço privilegiado do ensinar e aprender, organização de metodologias, didáticas com vistas à aprendizagem de habilidades e competências; b) aula como espaço relacional entre sujeitos e objetos, entre sujeito e sujeito. Nesse modo de pensar a aula, trata-se de um espaço onde as coisas não estão dadas de antemão. Aluno, professor, currículo, matéria de ensino tomam forma de relações e só existem na medida em que tais relações vão sendo construídas; c) aula como lugar de criação. Nesta prática, uma aula consistiria num modo de trabalhar uma determinada matéria de estudos em um espaço-tempo circunscrito. Podemos dizer que essa relação envolve determinadas táticas: por uma via, trata-se do modo como o professor escolhe seus materiais, os rearranja para cada aula, coloca sobre a mesa (LARROSA, 2018) e oferece aos seus estudantes, fazendo a matéria circular de maneira a torná-la pública.

Nessa terceira perspectiva, a aula é um trabalho de criação do professor. Então a aula não se justifica em ensinar conteúdos referentes a uma disciplina, reproduzi-los, transmiti-los, mediá-los. Também não é o lugar, tão somente, do ensino e da aprendizagem de conteúdos, competências ou habilidades que servem ao mercado. A aula é trabalho de pesquisa, exercício de pensamento, atividade de estudo e criação.  É em meio a esses movimentos que o professor cria a sua aula, a ensaia, oferece aos seus estudantes, torna-se o mediador entre as pessoas e o mundo (LARROSA, 2018). Ao fazer isso, ensina aos seus estudantes o exercício de educar o olhar, mobilizar os sentidos, direcioná-los para uma determinada atenção, que exige repetição, concentração e prática, abrindo-lhes um mundo de signos. Assim, os mostra o quanto é necessário abrir mão do olhar disperso a fim de desenvolver a capacidade de dar atenção a alguma coisa. Além disso, os ensina a sustentar esse olhar, manter e aprimorar essa atenção (LARROSA, 2018). O autor ressalta, nesse processo, o estilo de um professor, que mais do que uma forma ou aspecto, se caracteriza pelo seu movimento: “[…] ou, talvez melhor, a forma como produz um movimento que não é apenas seu, mas o dos textos” (LARROSA, 2018, p. 382). O instante da aula é então privilegiado e apontado em sua imprevisibilidade: o aqui-e-agora do momento impede o ato de seguir à risca roteiros e planejamentos – no encontro com outros (estudantes, textos, movimentos da aula), a criação se intensifica.

Retomando as três dimensões de uma aula, poderíamos dizer que as duas primeiras dimensões sempre estão presentes e talvez não seja possível desconsiderá-las. A terceira dimensão, objeto de estudo deste projeto, trata das potencialidades que envolvem cada aula, daquilo que uma aula poderá vir a ser, enquanto dispositivo de uma prática criadora.

Essa terceira dimensão de uma aula talvez ganhe ainda uma maior força quando nos deparamos com a pandemia, causada pelo Novo Coronavírus (SARSCov-2), que faz com que, inesperadamente, a aula torne-se uma experiência radicalmente diferente. Planejar e realizar aulas remotas, através do uso de tecnologias da informação e comunicação, implicou uma profunda transformação, não apenas do espaço e do tempo da aula, mas também das práticas pedagógicas do professor. A presença da voz, da escrita e até da imagem da tela, sem o corpo presente, nos obrigaram a construir outras gestualidades frente uma aula, constituindo-se em um desafio. Autores como Inés Dussel (2020), Morgado, Sousa e Pacheco (2020), Santos (2020) e Narodowski (2020), em publicações recentes, vêm problematizando a educação e o ensino em tempos de pandemia, levando-nos a pensar sobre as dimensões da aula. Se já não podemos estar todos juntos na mesma sala, como inventar a aula?

Diante dessas inquietações, lançamo-nos às seguintes problemáticas de pesquisa: de que modo a aula, a docência, o ensino e a aprendizagem estão sendo produzidos/produzem possibilidades de criação? O que está sendo dito e visto no campo da aula, do ensino e da docência? Que outras formas de aula/ ensino e aprendizagem estão sendo produzidas a partir da pandemia? Como pensar a aula enquanto um lugar de criação?

Tais perguntas estão sendo mobilizadas em discussões realizadas no Grupo CEM, por meio de três Grupos de Trabalho, os quais denominamos de GTs. Todos os GTs estão integrados à temática central e aos referenciais teóricos e metodológicos deste macroprojeto, lançando diferentes olhares e recortes para a presente pesquisa.