CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE DIREITO O CONCUBINATO E A PENSÃO POR MORTE Joaquim Malfatti Lajeado-RS, junho de 2009 B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE DIREITO O CONCUBINATO E A PENSÃO POR MORTE Joaquim Malfatti Monografia apresentada no Curso de Direito, como exigência parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientadora: Profª. Ms. Bianca Corberllini Bertani Lajeado-RS, junho de 2009 B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 2 DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a minha amada filha Aline e aos meus pais Modesto e Delinda (in memoriam), por representarem tudo o que existe de melhor em mim e por serem a razão maior da minha constante busca pela cultura, o que me leva a lhes retribuir com exemplo, carinho e respeito. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 3 AGRADECIMENTOS Vencidos os obstáculos outrora intransponíveis, agradeço a todos os que de uma ou de outra forma colaboraram para a concretização de um sonho realizado. Agradeço, especialmente, aos meus familiares, que não mediram esforços e paciência nesta minha extensa caminhada. Também agradeço aos professores, pelos ensinamentos oferecidos durante o curso e, em especial, à minha orientadora Professora Ms. Bianca Corbellini Bertani. Agradeço, ainda, aos meus colegas, pelo alto nível de urbanidade que transcorreu nossa convivência, tornando, assim, a aprendizagem prazerosa. E, finalmente, agradeço aos meus amigos em geral, pelo convívio oferecido nas horas de lazer. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 4 RESUMO A presente monografia está limitada à área do Direito de Família e do Direito Previdenciário, uma vez que trata se é possível ou não a concubina receber a pensão previdenciária por morte de seu companheiro. Inicialmente o trabalho faz uma análise da família e suas formas, examinando o Direito de Família, definindo o que é família e sua evolução, analisando ainda o casamento, a união estável e o concubinato. Após, verifica-se os efeitos jurídicos do concubinato e da união estável, bem como a diferença entre esses institutos, e entre o concubinato puro ou não-adulterino e impuro ou adulterino. Além disso, conceitua-se a pensão por morte, verificando-se sua previsão legal e requisitos constantes na Lei 8.213/1991. Examina-se a evolução da legislação, no que tange o direito à companheira receber este benefício. Por fim, faz-se uma análise da jurisprudência que já vem reconhecendo o direito da concubina a receber pensão previdenciária por morte. PALAVRAS-CHAVE: concubina e pensão previdenciária por morte. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 5 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CC - Código Civil CF - Constituição Federal CP – Código Penal CPC – Código de Processo Civil ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente P. – Página SS - Seguintes STF - Supremo Tribunal Federal STJ - Superior Tribunal de Justiça TRF – Tribunal Regional Federal § - Parágrafo B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 6 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 7 2 A FAMÍLIA E SUAS FORMAS ....................................................................... 9 2.1 O Direito de Família ................................................................................... 10 2.2 A definição de família e sua evolução ...................................................... 13 2.3 O casamento .............................................................................................. 19 2.4 A união estável ........................................................................................... 29 2.5 O concubinato ............................................................................................ 33 3 O CONCUBINATO E A UNIÃO ESTÁVEL ..................................................... 35 3.1 O concubinato e seus efeitos jurídicos..................................................... 35 3.2 A união estável e seus efeitos jurídicos.................................................... 38 3.3 Concubinato x união estável...................................................................... 43 3.3.1 Concubinato puro ou não-adulterino e impuro ou adulterino ............ 45 4 A PENSÃO POR MORTE E A CONCUBINA ............................................ 46 4.1 Conceito de pensão por morte................................................................. 46 4.2 Previsão legal e requisitos......................................................................... 47 4.3 A evolução do direito à pensão à companheira ...................................... 50 4.4 A jurisprudência e os direitos da concubina........................................... 51 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 57 REFERÊNCIAS ................................................................................................. 61 ANEXOS ............................................................................................................ 65 B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 1 INTRODUÇÃO Manter um relacionamento paralelo ao casamento, por mais que não seja bem aceito aos olhos da sociedade, sempre foi comum. Até então, mesmo que esse relacionamento fosse “estável”, o concubinato não era considerado uma relação familiar, não gerando direito à concubina de receber pensão por morte de seu companheiro, já que este direito era garantido apenas à esposa. Contudo, após anos sendo conhecida apenas como a ”amante”, mesmo mantendo um relacionamento estável, contudo, paralelo ao casamento, decisões jurisprudenciais recentes vêm dividindo seu entendimento, pois algumas dessas decisões estão reconhecendo o direito da concubina em dividir a pensão previdenciária com o cônjuge do de cujus. Portanto, entende-se ser relevante a análise do direito da concubina em receber a pensão previdenciária por morte, ante a ampliação do conceito de família, uma vez que, mesmo considerando a condição de casado de seu parceiro, a concubina e ele também viviam uma relação estável, não podendo ficar desamparada ante seu falecimento. Isso, porque há que se considerar o afeto que une seus integrantes, cujo relacionamento também forma uma família. Dessa forma, ante à dinâmica da vida, justifica-se a realização do presente trabalho, eis que, considerando as decisões jurisprudenciais que estão reconhecendo o direito da concubina em dividir a pensão previdenciária por morte com a esposa, constata-se estar muito próximo que a lei reconheça ser devido B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 8 também à concubina o pagamento desse benefício. Afinal, de fato, há a constituição de uma família. Assim, inicialmente, verificar-se-á os aspectos gerais das formas de família, detalhando-se o casamento, a união estável e o concubinato, até chegar ao foco, se é devida ou não a pensão por morte previdenciária à concubina. Antes de se examinar se é devido à concubina receber a pensão por morte, será realizada uma breve análise sobre o conceito de família e suas formas de constituição. Também será realizada uma análise sobre o casamento, união estável e também sobre o concubinato. Após, verificar-se-á o que é o concubinato, quando está configurado e se a concubina possui algum direito ante esse relacionamento, e, ainda, serão contrapostos o concubinato e a união estável. Além disso, será abordada a pensão por morte, seu conceito, sua previsão legal e seus requisitos, as mudanças na legislação para o pagamento deste benefício à companheira e se a concubina tem direito a recebê-la, com análise da jurisprudência. O método a ser utilizado na elaboração deste trabalho será o dedutivo, fundado em revisão bibliográfica, a qual envolve legislação, jurisprudência e fundamentos doutrinários. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 9 2 A FAMÍLIA E SUAS FORMAS Desde os primórdios, o homem sentiu a necessidade de viver em sociedade, formando vários grupos sociais, sendo que o primeiro deles foi a família. A família é uma construção social que se organiza com regras culturalmente ordenadas, formando modelos de comportamento onde cada um ocupa um lugar e possui uma função. (DIAS, 2005) O modelo convencional de família era formado pelo marido, esposa e filhos; contudo, verifica-se, com o passar do tempo, que ocorreu uma modificação nesse conceito, tendo a sociedade que se adaptar aos novos modelos de família. De acordo com Groeninga (2008), a família muda de acordo com as épocas e com a cultura, mas mesmo dentro de uma mesma cultura, varia de acordo com as condições sócio-econômicas em que está inserido o grupo familiar. Ainda, segundo ela, as atuais mudanças apresentadas no Direito de Família decorrem de transformações sociais recentes iniciadas pela revolução feminista1. Destaca que, genericamente as revoluções originam-se na luta pelo reconhecimento e aceitação social de qualidades e formas de ser e de se relacionar de um determinado grupo marginalizado por parte do grupo já reconhecido socialmente. 1 O movimento feminista teve sua origem na Europa Ocidental a partir do século XVIII. (WIKIPEDIA) B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 10 O fato é que, em decorrência da sociedade ser conservadora, para que houvesse o reconhecimento jurídico dos vínculos de afeto, bem como uma aceitação social das relações íntimas, foi estabelecido que a união entre casais ocorresse por meio do matrimônio. (DIAS, 2005) Contudo, destaca que com o passar do tempo verifica-se que o organismo familiar havia se modificado, acompanhando uma evolução natural. Por isso, constatou-se a necessidade da legislação acompanhar esse fato. Assim, a CF/1988 trouxe importantes alterações na lei no que se refere ao direito de família; principalmente, ao reconhecê-la como base da sociedade, bem como considerar válidas outras formas de entidades familiares, entre elas, a união estável e a família mono parental, além do casamento. (CHANAN, 2007) Diante disso, faz-se necessária a apresentação de alguns conceitos de família, sendo importante fazer uma breve análise das entidades familiares formadas pelo casamento, união estável e concubinato, examinando suas transformações. 2.1. O Direito de Família O Direito de Família é um ramo do direito civil, com características particulares, composto por um conjunto de normas que regulam as relações jurídicas familiares. (VENOSA, 2003) Já Monteiro (1997, p. 01) define o seu objeto: Todo homem, ao nascer torna-se membro integrante de uma entidade natural, o organismo familiar. A ela conserva-se ligado durante sua existência, embora venha a constituir nova família pelo casamento. O entrelaçamento das múltiplas relações, estabelecidas entre os componentes da referida entidade, origina um complexo de disposições, pessoais e patrimoniais, que formam o objeto do direito de família. Segundo Diniz (2002), considerando essas conceituações, em conformidade com sua finalidade, tais normas regem as relações pessoais, patrimoniais e assistenciais da família. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 11 Divide-se o direito de família em duas partes: a que estuda a sociedade conjugal em suas características e consequências e a que estuda a sociedade parental. (MIRANDA, 2000) Segundo Venosa (2003), no nosso ordenamento jurídico o direito de família era regulado exclusivamente pelo CC/1916. Contudo, a CF/1988 trouxe uma nova visão do Direito, apresentando-se como uma carta de princípios. “Os princípios – considerados leis das leis – deixaram de servir apenas de orientação ao sistema jurídico infraconstitucional desprovidos de força normativa”. (DIAS, 2005, p. 51) Ainda de acordo a autora, foi no direito de família que mais se refletiram os princípios eleitos pela CF/1988, os quais devem servir como referência no momento de apreciar a relação que envolve as questões familiares. Dentre os princípios norteadores do direito de família, destacam-se: - Princípio da monogamia, onde resta vedada a simultaneidade de relações. Contudo, destaca a CF/1988, que este não se trata de um princípio constitucional, mas em atenção a ele, o Estado considera crime a bigamia (artigo 235, CP) e criou impedimentos, descritos no artigo 1.521, VI do CC e a anulação do casamento artigo 1.548, II do CC. Prevê, ainda, a anulação de doação (artigo 550 do CC) e a infidelidade que serve como fundamento para ação de separação (artigo 1.572 e 1.573, I do CC); não dispondo ao concubinato efeitos jurídicos (artigo 1.727 do CC); - Princípio da dignidade da pessoa humana: é considerado o princípio maior, pois serve de baliza aos demais; - Princípio da liberdade: todos têm a liberdade de escolher o tipo de família que querem constituir. Há a liberdade de constituir uma relação conjugal ou uma união estável, bem como é possível optar entre a extinção ou dissolução do casamento e da união estável. A liberdade de alteração do regime de bens na vigência do casamento (artigo 1.639, § 2º do CC); a necessidade de o filho adotado, desde os 12 anos de idade, concordar com a adoção (artigo 45, § 2º do ECA), bem como poder impugnar o B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 12 reconhecimento levado a efeito enquanto era menor (artigo 1.614 do CC). Aponta ainda que o CC apresenta algumas inconstitucionalidades em decorrência da afronta a esse princípio, dentre elas: o prazo de um ano de casamento para separação consensual (artigo 1.574 do CC); exigência da separação de fato, por mais de dois anos para a realização do divórcio (artigo 1.580, § 2º do CC); imposição do regime de separação de bens para os maiores de 60 anos (artigo 1.641, II); possibilidade de ser negada a separação pretendida pelos cônjuges (artigo 1.574, parágrafo único do CC). - Princípio da igualdade e respeito à diferença: não apenas que a lei seja aplicada igualmente para todos, mas também que a lei considere a todos igualmente. Destaca os direitos e deveres previstos nos artigos 1.511 e 1.566, do CC; mútua colaboração da sociedade conjugal (artigo 1.567 do CC); liberdade de qualquer um dos nubentes acrescentar o sobrenome do outro (artigo 1.565, § 1º do CC); mesmos direitos e deveres dos pais no que diz respeito à pessoa e os bens dos filhos (artigos 1.631 e 1.690 do CC), bem como à guarda dos filhos (artigo 1.584 do CC); - Princípio da solidariedade familiar, onde há deveres recíprocos entre os integrantes do grupo familiar; - Princípio do pluralismo das entidades familiares: foram reconhecidas pelo Estado várias possibilidades de formação da família, inclusive as formadas por uniões extra matrimoniais; - Princípio da proteção integral a crianças e adolescentes: foi reservado um tratamento especial aos menores de 18 anos, considerando sua vulnerabilidade e fragilidade. Uma das principais alterações foi a vedação de referências discriminatórias entre os filhos (artigo 227, § 6º da CF); - Princípio da proibição de retrocesso social: as normas previstas na legislação devem ser interpretadas evitando-se que se operem retrocessos sociais; - Princípio da afetividade: o novo modelo de família traz uma preocupação maior com o afeto e a realização individual, o que restou consagrado na B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 13 Constituição Federal de 1988. Segundo DIAS (2005), o princípio norteador do direito das famílias é o da afetividade. Venosa (2003), dispõe que o direito de família é regido por um grande número de normas de ordem pública. Contudo, esse ramo não deve ser transformado em direito público, porque não se pode imaginar nada mais privado do que a família. E assevera que, considerando essa posição intermediária entre o direito público e o privado, há a possibilidade da elaboração de um Código de Família. No Código Civil atual os institutos que se referem ao direito de família constam nos artigos 1.511 a 1.783. 2.2 A definição de família e sua evolução A doutrina é unânime em enunciar que ao longo do tempo as famílias sofreram profundas transformações. As definições que até pouco tempo eram tidas como imutáveis, aos poucos vêm se demonstrando desgastadas pelas novas exigências da sociedade contemporânea. 2 (MATIELO, 1997) O fato é que a família “é um fenômeno fundado em dados biológicos, psicológicos e sociológicos regulados pelo direito”. (Venosa, 2003, p. 23) No decorrer do século XX verificou-se o quanto este instituto é passível de mutação. Sabe-se que a origem da família é remota. No entanto, há muitas contradições em relação à organização primitiva dela, conforme destaca Wolf (2004, p. 173): A Teoria da Monogamia Originária prega a afeição conjugal para a vida toda, dela tendo nascido o amor filial, a Teoria da Promiscuidade Primitiva relata ter existido um estágio tão primitivo, no qual imperava o comércio sexual promíscuo, anterior à monogamia e, por fim, a Teoria das Uniões Transitórias afirma que o homem e a mulher permaneciam juntos apenas por algum tempo após o nascimento do filho. 2 Para Chanan (2005) com a sociedade moderna a família passou a diferir das formas antigas em relação às suas finalidades e interesses. Segundo ele, “esta não mais se baseia no princípio político da autoridade de seu chefe, mas sim no princípio natural da consanguinidade”. (p. 46) B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 14 Pereira (2004) expõe em sua obra que registros históricos, como monumentos literários e fragmentos jurídicos comprovam que a família ocidental viveu por muito tempo sob a forma “patriarcal”. E isso, verificou-se também nas civilizações mediterrâneas e romanas, da mesma forma como está consagrada na Bíblia Sagrada. Segundo o autor, o padrão da família romana é retratado no tipo institucional encontrado no ocidente, assemelhando-se especialmente à família brasileira do século XIX. Neste tipo de organização familiar “o poder ficava concentrado na pessoa do ascendente masculino de maior idade, detentor de autoridade total sobre os componentes do grupo familiar ainda não emancipados. Também a esposa estava subordinada ao denominado patria protestas (...)”. (MATIELO, 1997, p. 12) Conforme leciona esse autor, a legislação brasileira foi inspirada em muitos dos ditames do Direito Romano, os quais foram adaptados à nossa realidade social, como por exemplo, o instituto do pátrio poder, alguns princípios básicos do matrimônio e da sociedade conjugal. Já na evolução pós-romana, a família passou a receber contribuições do direito germânico, adotando a espiritualidade cristã, reduzindo o grupo familiar aos pais e filhos e assumindo um cunho sacramental. E principalmente, o centro de sua constituição afastou-se do princípio da autoridade, passando para o da compreensão e do amor. (PEREIRA, 2004) Groeninga (2008, p. 23) defende que “houve uma evolução da família patrimonializada, sacralizada e matrimonializada para a família eudemonista”, ou seja, atualmente há uma preocupação maior com a felicidade de seus componentes. E também sustenta que a família sofre modificações nas suas bases e formas de estruturação, dada sua constante evolução. Destaca Chanan (2007, p. 46-47) : A família patriarcal, até então, revestida de caráter econômico, político, procracional e religioso, evoluiu como ente familiar, formando a partir de então um grupo vinculado por laços afetivos. Ocorreu, assim, uma renovação dos valores sociais que conduziram à transformação do conceito da família tradicional, valorizando a partir de então o aspecto da afetividade das relações familiares. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 15 No modelo atual de família, houve uma redução numérica no grupo familiar. A mulher passou a exercer atividade fora do lar e nas classes menos favorecidas, os menores começam a trabalhar muito cedo, adquirindo assim, maior independência (PEREIRA, 2004). Mas dispõe que essas mudanças também ocasionaram problemas sociais, fazendo com que o Estado exerça um papel mais atuante na sociedade, tendo uma maior preocupação na proteção da família. Importante salientar que para Groeninga (2008, p. 22) “a família, em primeiro lugar, é um sistema e, como tal, o todo da família é maior do que a soma das partes, dos membros que a compõem. Seus elementos estão em interação, que os mantém numa relação de interdependência”. Segundo Chanan (2007, p. 45), o conceito de família constitui-se atualmente para o Direito como sendo um “núcleo de desenvolvimento do ser enquanto pessoa humana, local de aprendizado, crescimento e participação”. E entende que no Direito pátrio, um marco para essa evolução foi a promulgação da CF/1988, “que rompeu com o modelo matrimonializado da família, trazendo como uma de suas inovações o princípio da pluralidade das entidades familiares”. Wolf (2004) destaca que a importância da família está consagrada no artigo 226 da CF/1988,3 que trouxe a evolução no Direito de Família no Brasil ao abandonar uma ideologia baseada no modelo clássico de família, já desagregado pela realidade da época, ao reconhecer, além do casamento civil, a união estável 3 Artigo 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração. § 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. § 4º - Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. § 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. § 6º - O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos. § 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. § 8º - O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 16 entre um homem e uma mulher, bem como aquela formada por qualquer um dos pais e seus descendentes, como entidades familiares. Groeninga (2008) também destaca que foi importante a CF/1988 estabelecer a proteção especial do Estado às novas formas de constituição de família, não apenas as formadas pelo casamento, mas também pela união estável, e ainda, as monoparentais, formadas por um dos genitores e seus filhos. Atualmente, a doutrina já vem destacando outra forma de constituição da família, que são as formadas por homossexuais, denominadas uniões homo afetivas. De acordo com Dias (2007), por mais que as uniões entre pessoas do mesmo sexo ainda não estejam previstas expressamente na Carta Magna e na legislação infraconstitucional, elas existem e fazem jus à tutela jurídica. Ainda de acordo com Dias (2007), estas uniões em nada diferem das uniões heterossexuais, devendo ser consideradas como união estável, sendo que não reconhece-las é uma atitude nitidamente discriminatória. E conclui que: “O caput do artigo 226 é, consequentemente, cláusula geral de inclusão, não sendo admissível excluir qualquer entidade que preencha os requisitos de afetividade, estabilidade e ostensibilidade”. (DINIZ, 2008, p. 173) Há quem entenda que apenas as entidades familiares expressas na CF/1988 estão sob a proteção do Estado. Contudo, conforme Chanan (2007, p. 49), “a Carta Magna brasileira não se restringe apenas ao reconhecimento explícito das entidades familiares não baseadas no matrimônio, mas permite também a interpretação extensiva, de modo a incluir as demais entidades implícitas”. E dentre essas entidades ele inclui as uniões homo afetivas e as relações concubinárias adulterinas, que salienta serem as menos usuais, mas cada vez mais ocorrentes. Confirmando a tese de que a família sofre constantes modificações e que estas são influenciadas pela época e pela cultura, o que reflete posteriormente no mundo jurídico, Dias (2005, p. 31) expõe: A sociedade só aceitava a família constituída pelo matrimônio, por isso a lei regulava somente o casamento, as relações de filiação e o parentesco. O reconhecimento social dos vínculos afetivos formados sem o selo da oficialidade fez as relações extra matrimoniais ingressarem no mundo B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 17 jurídico por obra da jurisprudência, o que levou a Constituição Federal a albergar no conceito de entidade familiar o que chamou de união estável. Viu-se o legislador na contingência de regulamentar este instituto e reintegrá-lo no livro do direito de família. Olvidou-se o Código Civil foi de disciplinar as famílias mono parentais reconhecidas pela Constituição como entidade familiar. Igualmente nada traz sobre as uniões homo afetivas, que vêm recebendo da jurisprudência reconhecimento no âmbito do direito das famílias. Dessa forma, verifica-se que a constituição das famílias não é propriamente um fato natural, mas sim uma decorrência da cultura, que se estabelece de uma maneira ou de outra, porém, sempre como uma organização do sujeito. A partir daí que o indivíduo se forma, tornando-se sujeito e submetendo-se às normas morais, tornando-se assim possível o estabelecimento de relações jurídicas. (PEREIRA, 2001) Portanto, é importante destacar que a função da família, apesar de sofrer constantes modificações históricas, ainda se mantém a mesma, qual seja, é a instituição responsável pela estruturação do indivíduo. (GROENINGA, 2008) Ainda, segundo a autora, é na família que as pessoas formam sua personalidade e desenvolvem sua capacidade de pensamento. Além disso, também se encontra na família a função de cuidado, principalmente dos pais com os filhos. Mas não se pode esquecer que atualmente há um destaque e uma grande discussão acerca do cuidado dos filhos em relação aos pais.4 Assim, considerando sua importância, Dias (2005) destaca a necessidade de proteção a este núcleo, por parte da sociedade e do Estado.5 Segundo a autora, a família é tanto uma estrutura pública como uma relação privada, contemplando 4 Artigo 229 da CF. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores tem o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. 5 Uma das formas de proteção das relações familiares encontradas pelo Estado foi a criação da Lei 11.340/2006, a fim de coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do artigo 226 da CF/1988. Dispõe o artigo 5º da referida lei: Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 18 que é inevitável haver uma limitação na intervenção do Direito na organização familiar para que as normas não causem prejuízos à liberdade do indivíduo. Porém, nesse diapasão, deve o Direito acompanhar a evolução da organização familiar. Isso porque, de acordo com Pereira (2004, p. 30), “Como organismo natural, a família não acaba. Como organismo jurídico, elabora-se a sua nova organização”. Além do mais, importante destacar que a lei considera um conjunto de qualidades para atribuir efeitos jurídicos às pessoas, denominado estado de família. (VENOSA, 2003) Dispõe o autor que estado de família é uma das características da personalidade da pessoa natural, conferido pelo vínculo que une uma pessoa às outras: casado, solteiro, etc., ou sob o aspecto negativo: ausência de vínculo conjugal, familiar, etc. E apresenta as seguintes características: - intransmissibilidade: não há como transferi-lo por ato jurídico, nem entre vivos nem por causa morte, pois é personalíssimo; - irrenunciabilidade: ninguém pode rejeitar seu estado por vontade própria. Como por exemplo, ninguém pode renunciar ao poder familiar. - Imprescritibilidade: é por sua natureza imprescritível pelo seu caráter personalíssimo; - universabilidade: possui essa característica, pois compreende todas as relações jurídico-familiares; - indivisibilidade: será sempre o mesmo perante a família e a sociedade. Como exemplo, pode-se dizer que uma pessoa não é considerada casada para algumas situações e solteira para outras; - correlatividade: o estado de família é recíproco, pois se integra por vínculos entre pessoas que se relacionam; - oponibilidade: é oponível pela pessoa diante de todas as outras. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 19 Diante disso, verifica-se que o estado de família é de extrema importância, a fim de que se possa determinar os direitos e deveres das pessoas no âmbito de suas relações familiares. 2.3 O casamento Segundo Wolf (2004) o homem sentiu a necessidade de legalizar as uniões, já que a exclusividade nas relações passou a prevalecer e destaca o que Pontes de Miranda leciona: A monogamia é o estado mais adequado e, quiçá, o único compatível, no plano jurídico, com a solidariedade social e as demais condições necessárias do aperfeiçoamento e do progresso humano. (...) O homem ou a mulher que se sente bem na convivência sexual, e não só sexual, com a sua companheira ou o seu companheiro, busca conservar as circunstâncias que lhe permitiam essa convivência. Só a monogamia atende a esse dado. (...)(MIRANDA, 2000, p. 211) O fato é que o formalismo do casamento decorre do Direito Canônico, que por meio do Decreto Papal de 1907 estabeleceu a adoção de várias formalidades no rito matrimonial, as quais persistem até hoje (VIEIRA, 2008). Contudo, conforme mesmo preceitua “a idéia que o casamento deve ser regulado pela lei civil surge apenas após a Revolução Francesa,6 previsão que, constante do Código Napoleônico,7 espalhou-se por diversos países”. (p. 36) Ainda, de acordo com VIEIRA (2008), no Brasil o casamento foi ignorado pela Constituição Federal de 1824, mas surgiu na de 1890, ratificado pela Carta Magna de 1891. No entanto, houve o afastamento da religiosidade em seus textos e, nas Constituições de 1934, 1946 e 1969, houve o reconhecimento do casamento religioso com efeitos civis. 6 Revolução Francesa é o nome dado ao conjunto de acontecimentos que, entre 5 de Maio de 1789 e 9 de Novembro de 1799, alteraram o quadro político e social da França. Em causa estavam o Antigo Regime (Ancien Régime) e a autoridade do clero e da nobreza. Foi influenciada pelos ideais do Iluminismo e da Independência Americana (1776). Está entre as maiores revoluções da história da humanidade. (WIKIPEDIA) 7 O Código Napoleônico (originalmente chamado de Code Civil des Français, ou código civil dos franceses) foi o código civil francês outorgado por Napoleão I e que entrou em vigor em 21 de março de 1804. (WIKIPEDIA) B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 20 Verifica-se que, após seu reconhecimento, o casamento foi consagrado em todas as Constituições Federais, sendo o mesmo vinculado ao conceito de família e identificado como sendo indissolúvel. (DIAS, 2005) Na Carta Magna atual, o casamento está previsto no artigo 226 onde há a previsão de reconhecimento dos efeitos civis ao casamento religioso,8 bem como a gratuidade na celebração civil. No Código Civil de 1916, o único modo de se constituir uma família era pelo casamento. Naquela época o casamento era indissolúvel. A única forma de rompê-lo era por meio do desquite, mas como ele não extinguia o vínculo matrimonial, não permitia novo casamento. (DIAS, 2005) Segundo a autora, a Lei do Divórcio9 não afastou a visão matrimonializada da família. Mas, mesmo havendo duas possibilidades de romper o casamento (separação e divórcio), era exigido um decurso de prazo ou que fosse identificado o responsável pela separação. Além disso, o culpado pela separação perdia o direito de receber alimentos. A autora também destaca que o Código Civil atual traz 128 artigos que tratam sobre o matrimônio, sem, contudo, em nenhum momento, definir ou conceituar o que seja família ou casamento. Cumpre referir primeiramente que, conforme leciona Pereira (2001), é preciso cercar, dispor de cuidado especial para não confundir a família com o casamento, já que muitos, equivocadamente, asseveram que esta é formada pelo casamento, este, na verdade, é apenas uma das formas de constituição da família. De acordo com Venosa (2003, p. 40), ”o casamento é o centro do direito de família. Dele irradiam suas normas fundamentais”. 8 De acordo com Canezin (2008, p. 83) “O casamento religioso com efeitos civis é realizado entre pessoas que não possuem impedimentos matrimoniais, mas que preferiram que o celebrante fosse o líder religioso e não a autoridade competente”. Porém, ressalta que apesar de ser celebrado pela autoridade religiosa, este deve obedecer às formalidades legais exigidas para a celebração civil, para que possibilite o registro do matrimônio. 9 Lei 6.515/1977 B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 21 Assim, entende-se que, apesar do casamento ser uma das maneiras de constituição de família, considerando ter sido a primeira forma oficial de união entre homem e mulher, não há como olvidar o destaque que ocupa no direito de família. Não encontramos na legislação a definição do casamento, mas no Código Civil atual há a previsão da sua finalidade em seu artigo 1.511: ”O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges”. Esse instituto é assim definido na doutrina: E o casamento vem a ser um contrato solene pelo qual duas pessoas de sexo diferente se unem para constituir uma família e viver em plena comunhão de vida. Na celebração do ato, prometem elas mútua fidelidade, assistência recíproca, e a criação e educação dos filhos. (RIZZARDO, 2007, p. 17) Já para Wolf (2004, p. 174): O casamento é a união entre homem e mulher, que implica a igualdade de vida e comunhão de corpos e de espíritos, formalizada através de um contrato de Direito de Família que regula a vida em comum, cujo registro lhe dá existência jurídica e gera efeitos civis, de acordo com as regras estabelecidas no Código Civil brasileiro. Para Pereira (2004, p. 53), “o casamento é a união de duas pessoas de sexo diferente, realizando uma integração fisiopsíquica permanente”. Diniz (2002) dispõe que o casamento é a mais importante e influente de todas as instituições de direito privado, já que é uma das bases da família, que por sua vez, é o fundamento da sociedade. Os princípios basilares de sua constituição são a forma livre de escolha mútua: a monogamia, a indissolubilidade e a convivência em comunidade. (RIZZARDO, 2007) O primeiro refere-se ao fato de caber unicamente aos nubentes manifestar sua vontade de escolha, não sendo tolerado, como ocorre em algumas sociedades, que os pais escolham os noivos e os obrigue a casar. (VENOSA, 2003) A monogamia está vinculada ao fato de não ser permitida a existência simultânea de dois ou mais vínculos matrimoniais, contraídos pela mesma pessoa, sendo punida criminalmente a bigamia, artigo 235 do CP (DINIZ, 2002). B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 22 Com relação ao princípio da indissolubilidade, mesmo sendo reconhecido por alguns autores, como Venosa (2003), com a promulgação da Lei do Divórcio nº 6.515/77, esse princípio foi abolido pelo nosso sistema jurídico. Entende-se que, por mais que o casamento possua em sua origem, como um de seus requisitos, a indissolubilidade, verifica-se que atualmente esse princípio foi fragmentado pela possibilidade de seu rompimento (separação/divórcio). Já o último princípio pode ser visto como a comunhão de vida para os cônjuges e a união entre eles. (MONTEIRO, 1997) Ademais, o artigo 1.565 do CC atribui ao casal responsabilidades comuns pela eficácia do casamento: “[...] homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família”. Portanto, de acordo com os conceitos e princípios apresentados, pode-se concluir que no casamento há um comprometimento maior entre homem e mulher,10 já que formalizam essa união por meio de um contrato, assumindo um compromisso de fidelidade e de uma relação estável e duradoura em prol de um interesse comum do casal. Ainda, a sua natureza jurídica pode ser vista sob três correntes: a contratualista, a institucionalista e a eclética ou mista. A primeira entende que “o matrimônio é um contrato civil, regido pelas normas comuns a todos os contratos, ultimando-se e aperfeiçoando-se apenas pelo simples consentimento dos nubentes (...)”. (DINIZ, 2002, p. 42-43) Já a segunda, de acordo com a autora, defende que “o casamento é tido como uma grande instituição social, refletindo uma situação jurídica que surge da vontade dos contraentes, mas cujas normas, efeitos e forma encontram-se preestabelecidas em lei”. (p. 43) 10 Em alguns países como Holanda, Bélgica, Canadá e Espanha, é legalizado o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo. No Brasil, o casamento entre homossexuais não está previsto na legislação, mas já existem decisões reconhecendo uniões homoafetivas, como sendo uniões estáveis. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 23 Com relação à última teoria, Diniz (2002), destaca que esta reúne as duas primeiras, unindo a vontade ao elemento institucional, ou seja, simultaneamente há o contrato e a instituição, sendo o primeiro na formação e esta última no conteúdo. Para Monteiro (1997), o casamento deve ser visto apenas como instituição, já que convertê-lo a um simples contrato seria compará-lo a uma venda ou a uma sociedade, afastando seu nobre e elevadas finalidades. Venosa (2003, p. 41), adepto da terceira teoria, define que “o casamento- ato é um negócio jurídico; o casamento-estado é uma instituição”. Ademais, entende-se que “o casamento tem de ser definido sob o prisma psicológico, que envolve o ponto mais importante, qual seja o amor entre os nubentes e sob a ótica jurídica, que englobará os direitos e deveres advindos do ato”. (VIEIRA, 2008, p. 37) Dias (2005, p. 143-144) ainda ressalta que: “o ato do casamento cria um vínculo entre os noivos, que passam a desfrutar do estado de casados. Ocorre igualmente a alteração do estado civil dos consortes que, de solteiros, passam à condição de casados”. Também destaca que com a sua celebração, ocorre a alteração da situação patrimonial dos bens, sendo que a determinação do estado civil serve para dar publicidade, a fim de proporcionar segurança a terceiros em relação à condição pessoal e patrimonial do indivíduo. Verifica-se ainda que “o casamento importa em comunhão de vida entre os cônjuges, emancipando-os, se menores; altera o respectivo estado civil, constitui parentesco por afinidade; dá causa, se essa for a vontade dos consortes, à modificação do sobrenome”. (VIEIRA, 2008, p. 88) Os trâmites necessários para a realização do casamento estão previstos no CC, no Livro de Direito de Família. Entretanto, primeiramente, para a celebração do casamento, é indispensável que se verifique se estão sendo atendidos os pressupostos de existência, os quais consistem na diversidade de sexo, uma vez que a legislação pátria somente prevê casamento entre homem e mulher; no consentimento, pois não pode ser celebrado se ambos os nubentes não B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 24 consentirem; e, na celebração, uma vez que a lei dispõe que será considerado inexistente o casamento, se a celebração não seguir o que preceitua os artigos 1.533 a 1.535 do CC. (FUJITA, 2008) No artigo 1.525 e ss, encontra-se o processo de habilitação.11 Conforme Pereira (2004, p. 100), “O processo de habilitação tem por finalidade proporcionar aos nubentes evidenciar sua aptidão para o casamento, apresentando provas necessárias a que a autoridade judiciária lhes defira o pedido”. Já a partir do artigo 1.533 estão previstas as formalidades para o ato da celebração do casamento. O comprovante da sua realização se dá por intermédio da certidão de registro, de acordo com o artigo 1.543 do CC, documento esse que é extraído do assento lavrado no livro de registro. Ainda, importante destacar que a legislação pátria prevê causas que impedem a realização do casamento, as quais constam no CC, no artigo 1.521. Dispõe o referido diploma legal: Artigo 1.521. Não podem casar: I - os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil; II - os afins em linha reta; III - o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante; IV - os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive; V - o adotado com o filho do adotante; VI - as pessoas casadas; VII - o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte. Segundo Fujita (2008, p. 54) “os impedimentos matrimoniais são proibições impostas pela lei para que alguém contraia um casamento válido, sob pena de sua nulidade, em hipótese de sua infringência”. Tais impedimentos, de acordo com o artigo 1.522 do CC, poderão ser opostos até o momento da celebração do casamento e por qualquer pessoa capaz. 11 Artigo 1.531 do Código Civil. Cumpridas as formalidades dos artigos 1.526 e 1.527 e verificada a inexistência de fato obstativo, o oficial do registro extrairá o certificado de habilitação. Artigo 1.532. A eficácia da habilitação será de noventa dias, a contar da data em que foi extraído o certificado. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 25 Além disso, encontramos no CC, no artigo 1.523 as causas suspensivas do casamento, que de acordo com Pereira (2004) não tem por efeito a invalidade do casamento, mas impõe a sanção de vigorar o regime de separação de bens. São elas: Artigo 1.523. Não devem casar: I - o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros; II - a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal; III - o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal; IV - o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas. Conforme artigo 1.524 do CC, as causas suspensivas poderão ser arguidas pelos parentes em linha reta de um dos nubentes, consanguíneos ou afins, e pelos colaterais em segundo grau, também consanguíneos ou afins. Isso poderá ser feito até quinze dias após a publicação dos proclamas ao Oficial de Registro Civil e, ao final desse prazo até a cerimônia matrimonial, ao juiz de casamento que realizará a celebração. (FUJITA/2008) Temos ainda previsto no artigo 1.548 do CC, as causas que tornam o casamento nulo, bem como no artigo 1.550 do mesmo diploma legal, as causas que podem anular o matrimônio. Artigo 1.548. É nulo o casamento contraído: I - pelo enfermo mental sem o necessário discernimento para os atos da vida civil; II - por infringência de impedimento. Artigo 1.550. É anulável o casamento: I - de quem não completou a idade mínima para casar; II - do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal; III - por vício da vontade, nos termos dos artigos 1.556 a 1.558; IV - do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento; V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges; VI - por incompetência da autoridade celebrante. Parágrafo único. Equipara-se à revogação a invalidade do mandato judicialmente decretada. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 26 De acordo com o artigo 1.549 do CC, a decretação de nulidade das causas previstas no artigo 1.548 do CC poderá ser promovida por ação direta por qualquer interessado ou pelo Ministério Público. Salienta-se ainda que, segundo o artigo 1.639 do CC, os nubentes têm a opção de estipular o regime de bens12 a ser adotado, podendo escolher entre o regime de comunhão parcial de bens, comunhão universal de bens, regime de participação final nos aquestos e separação de bens. O artigo 1.658 do CC prevê que no regime da comunhão parcial de bens comunicam-se os bens adquiridos pelo casal na constância do casamento, com exceções previstas no artigo 1.659 e SS do referido diploma legal. Este é o regime legal de bens, sendo que na falta de manifestação dos cônjuges quanto à escolha dos regimes previstos por lei, ou no caso de ser considerado nulo o pacto, ou vir a ser anulado, esse será o regime adotado. (MADALENO, 2008) Já no regime da comunhão universal previsto no artigo 1.667 do CC, há a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges, inclusive dívidas, com exceções previstas no artigo 1.668 do CC. No caso do regime de participação final nos aquestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio e lhe cabe à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, na constância da união, adquiridos a título oneroso, de acordo com o artigo 1.672 do CC. Finalmente, no caso de ser escolhido o regime da separação de bens, constante no artigo 1.687 do CC, estes serão exclusivamente administrados pelo cônjuge proprietário, que poderá alienar ou gravar de ônus real. Segundo Madaleno (2008, p. 103): Antes de celebrado o casamento, os cônjuges podem estipular o regime que lhes aprouver, salvo quando a lei impõe o regime obrigatório da separação de bens (incisos I, II e III do artigo 1.641 do CC), como ocorria no Código Civil de 1916 (parágrafo único, incisos I, II, III e IV do artigo 258). Não havendo convenção antenupcial, ou sendo ela nula ou ineficaz, vigorará entre os cônjuges o regime da comunhão parcial (artigo 1.640 do CC). 12 O regime matrimonial é escolhido pelos nubentes por convenção, denominado pacto antenupcial. (MONTEIRO, 1997) B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 27 Conforme dispõe o autor, quando não houver um dos impedimentos previstos no artigo 1.641 do CC,13 poderão os nubentes estipular por meio de escritura pública de contrato antenupcial qualquer um dos regimes de bens previstos na legislação, podendo, inclusive, unir os diferentes regimes matrimoniais ou criar outra modalidade, desde que não infrinjam disposição de lei, em conformidade com o artigo 1.655 do CC,14 bem como não prejudiquem os direitos e deveres conjugais. Além do mais, dispõe que será nulo o contrato que não for lavrado por escritura pública, de acordo com o artigo 1.653 do CC,15 bem como será ineficaz se não lhe seguir o casamento. Uma importante inovação trazida pelo CC de 2002 foi permitir a modificação do regime de bens na constância do casamento, mediante a realização de pedido judicial, fundamentado e requerido por ambos.16 (PEREIRA, 2004) Para Madaleno (2008), a possibilidade de modificar o regime de bens na constância do casamento atende à evolução das relações dos casais, tanto em razão da igualdade dos gêneros sexuais, quanto pelo fato de comunicar patrimônio ao parceiro que anteriormente não o tinha, pela escolha inicial de separação total de bens, o que representa o reconhecimento de sua contribuição na construção econômica do casal. Por fim, importante destacar que a sociedade conjugal pode ser dissolvida. De acordo com Barbosa (2008), é necessário referir que o vínculo matrimonial 13 Artigo 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento: I - das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; II - da pessoa maior de sessenta anos; III - de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial. 14 Artigo 1.655. É nula a convenção ou cláusula dela que contravenha disposição absoluta de lei. 15 Artigo 1.653. É nulo o pacto antenupcial se não for feito por escritura pública, e ineficaz se não lhe seguir o casamento. 16 Artigo 1.639. É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver. § 2o É admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 28 estabelecido pelo casamento difere da sociedade conjugal, já que é um instituto jurídico de menor âmbito, é abrangida pelo casamento e, assim, destaca que não se pode confundi-los. O artigo 1.571 do CC dispõe que a sociedade conjugal termina com a morte de um dos cônjuges, pela nulidade ou anulação do casamento, pela separação judicial e pelo divórcio. Segundo o autor, “o Código Civil inovou a Lei do Divórcio, prevendo, além da morte natural, a presumida do ausente”. Isso foi muito importante, uma vez que no antigo sistema, a morte presumida somente produzia efeitos de ordem patrimonial ou sucessória, sendo que agora há a dissolução do vínculo independente do tempo de ausência. (BARBOSA, 2008, p. 136) As causas de nulidades ou anulações do casamento estão previstas nos artigos 1.548, 1.550 e ss do Código Civil. A separação judicial dissolve a sociedade conjugal, sem, contudo, romper o vínculo matrimonial. Prescreve o artigo 1.576 do CC: “A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e fidelidade recíproca e ao regime de bens”. Contudo, os deveres conjugais de mútua assistência, sustento, guarda e educação dos filhos e o dever de respeito e consideração mútuos, previstos no artigo 1.566 do CC, ainda se mantêm após a separação. O pedido de separação requerido por ambos os cônjuges é denominado separação consensual, conforme artigo 1.574 do CC. Já, quando o pedido de separação é realizado por um só cônjuge, denomina-se separação litigiosa, prevista no artigo 1.572 do CC. Para Barbosa (2008), é fundamental que na ação de separação seja ajustada a guarda dos filhos, devendo ainda ser fixada a alimentação a eles no próprio processo. Na separação, o cônjuge ainda poderá optar por alterar seu nome, excluindo o nome de casado. Mas, caso a mulher opte por manter o do seu ex-marido, poderá a qualquer tempo voltar a usar o de solteira. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 29 Importante destacar que a lei prevê o restabelecimento da sociedade conjugal, não importando a causa da separação judicial, mediante pedido ao juiz, conforme artigo 1.577 do CC. A última forma de término da sociedade conjugal é o divórcio, o qual é responsável por dissolver o casamento válido, segundo prevê o artigo 1.571, § 1º do CC. Isso possibilita que os divorciados contraiam novo casamento. Caso não ficarem estabelecidos antes da dissolução do vínculo conjugal, o divórcio extinguirá os deveres e os direitos a alimentos entre as partes, em decorrência do dever de mútua assistência. Contudo, ficam inalterados os direitos e os deveres dos pais em relação aos filhos. (BARBOSA, 2008) Verifica-se ainda no artigo 1.580 do CC, a possibilidade de conversão da separação judicial em divórcio, igualmente podendo ser consensual ou litigiosa. Ademais, no caso de comprovada separação de fato por mais de dois anos, é possível fazer o pedido de divórcio direto, previsto no artigo 1.580, § 2º do CC, que também poderá ser consensual ou litigioso. É importante também consignar que o CC de 2002, em seu artigo 1.581, inovou ao possibilitar que seja decretado o divórcio sem que haja a partilha de bens e isso em todas as suas formas de realização. Portanto, de acordo com Dias (2005), quando acaba o afeto, que é a base de sustentação da família, impõe-se a dissolução do vínculo, a fim de que a pessoa possa manter seu amor próprio e respeito. 2.4 A união estável As relações de afeto entre homem e mulher fora do casamento sempre existiram, embora houvesse uma repudia social e do legislador em relação a isso. (DIAS, 2005) B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 30 Contudo, considerando a evolução da sociedade, a legislação teve que acompanhar as transformações ocorridas, criando assim vínculos jurídicos com a união estável. O CC de 1916 não reconhecia direitos às famílias constituídas fora dos padrões oficiais do casamento civil ou religioso com efeitos civis, com a finalidade de proteger estas entidades familiares. (DIAS, 2005) Segundo a autora, os primeiros julgamentos que estimularam uma doutrina concubinária são da década de 60, já que a partir desta data, iniciaram-se casos de rompimento da relação por meio da separação ou morte. Destaca ainda que, em decorrência das reclamações generalizadas, a doutrina e a jurisprudência passaram a reconhecer certos direitos aos outrora concubinos, que posteriormente foram chamados companheiros, nas uniões denominadas sociedade de fato. Refere que, nesta modalidade, havia a necessidade de prova da contribuição financeira para a constituição do patrimônio por parte dos companheiros a fim de que os “sócios” realizassem a “divisão dos lucros”. Isso com o intuito de evitar o enriquecimento injustificado de um dos companheiros. Contudo, não se tencionava conceder alimentos, nem direito sucessório. A Súmula 380 do STF trouxe a regulamentação: “comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”. Entretanto, verifica-se que o auge desse reconhecimento operou-se com a CF/1988, que reconheceu também a união estável como entidade familiar e, após, foram editadas leis especiais sobre a matéria (OLIVEIRA, 2008). O fato é que, em razão da CF/1988, foram editadas duas novas leis: a 8.971/94 e 9.278/96. A primeira veio assegurar o direito a alimentos e a sucessão do companheiro. Essa lei fixou que somente seriam reconhecidas como estáveis, as uniões com prazo mínimo de 5 (cinco) anos, ou as que resultassem no nascimento de filhos. Além disso, assegurou ao companheiro sobrevivente o usufruto sobre parte dos bens deixados pelo de cujus, bem como garantiu a B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 31 inclusão do companheiro como herdeiro quando não havia descendentes ou ascendentes. Já a segunda lei trouxe mudanças, ao estabelecer não haver um prazo rígido para a caracterização da união estável, revogando o estabelecido na lei anterior. Outra novidade foi ter acolhido as relações entre pessoas separadas de fato. Também fixou a competência das varas de família para o julgamento dos litígios, tema que trazia muitas controvérsias, uma vez que se discutia se esta matéria era de direito de família ou das obrigações (COSTA, JÚNIOR, 1999). Ainda, em seu artigo 5º, estabeleceu que os bens adquiridos pelos conviventes, na constância da união estável e a título oneroso, são frutos do esforço em comum, passando a pertencer a ambos se não houver estipulação contrária. Outro fato importante foi a previsão no artigo 7º, parágrafo único, que reconheceu o direito real de habitação. Já o artigo 8º também inovou ao permitir a conversão da união estável em casamento (COSTA JÚNIOR, 1999). Verifica-se que a Lei 9.278/96 serviu como base para a regulamentação da união estável, mesmo tendo deixado lacunas que ainda instigam os operadores do direito, conforme dispõe Pereira (2004). A união estável pode ser definida como sendo: “[...] aquela formada por um homem e por uma mulher, desimpedidos e, portanto, livres, aptos a contraírem matrimônio, representada na convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família” [...] (WOLF, 2004, p. 177). Para Dias (2005), a união estável surge da convivência, o que considera um simples fato jurídico que se transforma num ato jurídico em decorrência dos direitos que nascem dessa relação. Destaca que, mesmo não tendo o ordenamento jurídico considerado o afeto, o que também foi ignorado pela doutrina, este entrou no mundo jurídico. Segundo a autora, a união estável inicia por um vínculo afetivo, o qual, a partir do momento em que se torna visível passa a ser merecedor da tutela jurídica. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 32 Conforme o dicionário Aurélio (Ferreira, 1999), convivência significa “ato ou efeito de conviver; relações íntimas; familiaridade, convívio”. Portanto, verifica-se que para configurar a união estável é necessária uma vida em comum por um prazo que indique uma estabilidade no compromisso, ou seja, duradoura (OLIVEIRA, 2008). No dicionário mencionado também consta que esta deverá ser pública, isto é, de conhecimento do meio familiar, profissional e social dos compromitentes; e contínua, sem interrupções que lhe retirem a característica de permanência. Ademais, entende que deve haver o objetivo de estabelecer uma família. Pereira (2001, p. 29) leciona como elementos caracterizadores da união estável: “a durabilidade da relação, a existência de filhos, a construção patrimonial em comum, affectio societatis, coabitação, fidelidade, notoriedade, a comunhão de vida, enfim, tudo aquilo que faça a relação parecer um casamento”. Contudo, admite que a coabitação não se torna mais indispensável para caracterizar a união estável. Da mesma forma, reconhece que a existência de filhos também não é mais um elemento determinante da relação. A fim de ver regulamentada esta situação, o STF editou a Súmula 382 que dispõe: “a vida em comum sob o mesmo teto, more uxorio, não é indispensável à caracterização do concubinato”. Diante do exposto, verifica-se que os elementos que caracterizam a união estável são os mesmos que traçam o conceito de família. Porém, a falta de algum deles não significa que não está configurada essa relação, devendo cada caso ser analisado com suas particularidades (PEREIRA, 2001). Por tais motivos é que não se pode comparar a união estável com eventual namoro ou romance, já que essa consiste num acordo de vontades com o objetivo de estabelecer uma família (COSTA JÚNIOR, 1999). B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 33 2.5 O Concubinato De acordo com Wolf (2004), nos casos em que homem ou mulher casados, não separados de fato de seus cônjuges, passam a manter um relacionamento extramatrimonial, está configurado o concubinato. Mesmo que esta relação possua características de união estável, não pode ser comparado a esta. A união concubinária é definida por Rizzardo (2007, p. 899) como: Concubinária ou adulterina será a união quando há impedimento para o matrimônio. Desde que se dê a união prolongada, ou a convivência constante, infringindo as disposições que impedem o casamento, transforma-se em adulterina ou espúria a união, formando o concubinato. Assim, verifica-se que o concubinato se trata de uma união não oficializada e com uma certa durabilidade, paralela às relações oficiais, conforme Pereira (2001). Alguns doutrinadores são contra a concessão de direitos a quem mantém essa relação, defendendo que elas não podem ser comparadas à união estável, mesmo que tenham se estendido no tempo e gerado filhos, já que lhes faltam os demais requisitos. O fato é que a relação tem que ser pública e não apenas se restringir a um determinado grupo social, devendo apresentar outros relevantes pressupostos como a fidelidade, a exclusividade e a coabitação. (WOLF, 2004) Considera que não pode ser estável uma relação adulterina de encontros ocasionais e, principalmente, porque no caso haverá um casamento que não foi desfeito, de fato ou de direito. E destaca que: Ademais, proteger as relações concubinárias adulterinas como entidades familiares, implicaria também punir o próprio cônjuge, não partícipe do adultério, acaso reconhecidos, por exemplo, efeitos patrimoniais decorrentes do concubinato, tirando de seu patrimônio os recursos de um benefício construído ao longo de uma vida conjugal, castigando a verdadeira vítima que suportou estoicamente as adversidades que lhe foram escondidas e pior, para premiar quem, co-culpado, permaneceu por sua consciência e vontade, nesta relação adulterina. De acordo com Dias (2005), a doutrina ainda distingue modalidades de ligações livres, eventuais, transitórias e adulterinas com a finalidade de afastar a identificação da união como estável, considerando tais relações desprovidas de efeitos positivos na esfera jurídica. E ressalta que os concubinatos, conhecidos B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 34 como adulterino, impuro, impróprio, espúrio, de má-fé, concubinagem, etc. são alvos de repúdio social. Verifica-se dessa forma que ela é contrária ao pensamento de que a união concubinária não pode ser comparada à união estável e gerar direitos. A autora destaca que estas relações são de afeto e, apesar de serem consideradas adulterinas, geram consequências jurídicas. Por isso defende que as relações concubinárias devem ser reconhecidas como união estável a fim de evitar enriquecimento injustificado por parte de um dos concubinos. No capítulo a seguir serão analisados os efeitos jurídicos do concubinato e da união estável, bem como, diferenciar-se-á estes institutos. Da mesma forma far- se-á uma distinção entre concubinato puro (não adulterino) e impuro (adulterino). B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 3 O CONCUBINATO E A UNIÃO ESTÁVEL Antes de constatar se é devida à concubina a pensão por morte, será feita uma análise sobre os aspectos relevantes do concubinato, principalmente seus efeitos jurídicos. Ainda, serão examinados a união estável e seus efeitos jurídicos e será realizada uma distinção entre concubinato e união estável. Por fim, diferenciar-se-á o concubinato puro, também conhecido como não-adulterino, e o impuro, também denominado de adulterino. 3.1 O concubinato e seus efeitos jurídicos O Código Civil, no artigo 1.727, define que as relações não eventuais entre homem e mulher, impedidos de casar, constituem concubinato. Oliveira (2008) entende que o intuito do legislador, ao definir o concubinato num artigo específico, foi destacar que a esta espécie de entidade familiar não há previsão de direitos. Contudo, Pereira (2007, p. 199) conclui que o artigo 1.727 do CC “apenas menciona a existência da figura do concubinato, mas é omisso quanto aos efeitos jurídicos”. Wolf (2004, p. 176-177) dispõe que, no artigo 1.723 do CC, é “possível constatar que a união estável reconhecida como entidade familiar trata do concubinato não adulterino, ou seja, do concubinato puro, pois o concubinato adulterino ou impuro não recebe a proteção do Estado”[...]. Além disso, Oliveira (2008, p. 167) destaca: B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 36 A conceituação legal de concubinato exclui os casos de relações eventuais, fugazes, que se iniciam com o ato de ‘ficar’, podendo ou não evoluir para o ‘rolo’, acate o aconchego sexual esporádico (fornicatio simplex), ou compromissos de namoro caracterizando a situação de amantes, sem a figuração típica do ente familiar. Portanto, verifica-se que para configurar o concubinato é necessária a existência de convivência, com a demonstração clara de afetividade, mas que de alguma forma estão impedidas de contraírem matrimônio (CHANAN, 2007). Por mais que o concubinato, chamado de adulterino, impuro, impróprio, etc., seja visto com repúdio social, isso não o faz desaparecer, e a invisibilidade a que a Justiça o condena somente privilegia o bígamo: “São relações de afeto, apesar de consideradas adulterinas, e podem gerar consequências jurídicas” (DIAS, 2005, p. 179). Dispõe ainda: A quem quer negar-lhes efeitos jurídicos, justificativas não faltam. A alegação é de que a distinção entre concubinato adulterino e união estável busca manter coerência com o preceito ordenador da monogamia. Outro fundamento de grande voga é de que o Estado não pode dar proteção a mais de uma família ao mesmo tempo” (DIAS, 2005, p. 179). E conclui que esse raciocínio privilegia o infiel, uma vez que a pessoa que escolhe por relacionar-se com alguém impedido de casar, em razão de já ser casado, é punida por sua escolha e consequências. Diante disso, reconhece que “a mantença de duplo relacionamento gera a irresponsabilidade de quem foi infiel. Uniões que persistem por toda uma existência, muitas vezes com extensa prole e reconhecimento social, são simplesmente expulsas da tutela jurídica”. (DIAS, 2005, p. 180) Uma das principais punições dessa escolha verifica-se no plano material, já que ainda há muitas vedações de direitos ao concubinato adulterino, em resguardo ao direito da família constituída pelo casamento, de acordo com Oliveira (2008, p.167-168): - proibição de doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice, com possibilidade de ser anulada pelo outro cônjuge ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal (artigo 550); a reivindicação dos bens doados nessas circunstâncias restringe-se, porém, aos bens comuns do casal e se condiciona à prova de que os bens não foram adquiridos pelo esforço comum do B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 37 outro cônjuge e do seu concubino, se o casal estiver separado de fato há mais de cinco anos (artigo 1.642, inciso V); - invalidade da instituição do companheiro como beneficiário de seguro de pessoa, se ao tempo do contrato o segurado não estava separado judicialmente nem separado de fato (artigo 793, que está redigido em sentido contrário, ou seja, para somente validar a doação em caso de achar-se, o segurado, separado judicialmente ou de fato); nota-se imprecisão no emprego da palavra “companheiro”, que é exclusivo da união estável, em vez de “concubino”, que seria adequado na espécie descrita no artigo; - nulidade do testamento em favor do concubino por testador casado, salvo se este, sem culpa sua, estiver separado de fato do cônjuge há mais de cinco anos (artigo 1.801, inciso III, e 1.900, inciso V); merece reparos a menção ao tempo de separação de fato, em contraste com o artigo 1.723, parágrafo primeiro, que possibilita união estável de pessoa casada e separada de fato sem exigir prazo mínimo; também não se compreende a falta de menção ao testador casado e separado judicialmente, que, por certo, tem livre disponibilidade para testar em favor do companheiro; - ilicitude da deixa ao filho do concubino, quando não o for também do testador (artigo 1.803, que somente considera lícita a outorga em favor de filho do concubino em comum com o testador); a disposição confirma entendimento jurisprudencial cristalizado na Súmula 447 do STF. Diniz (2002, p. 335) destaca também as seguintes vedações: - A do artigo 1.521, VI, do Código Civil, que veda a conversão em matrimônio por haver impedimento matrimonial entre os concubinos, não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se encontrar separada de fato (CC, artigo 1.723, § 1º). - A do artigo 1.694 do Código Civil, que estabelece os alimentos como dever recíproco de socorro por efeito do matrimônio e da união estável. Funda, assim, o dever alimentar no matrimônio ou na união estável, não reconhecendo, a concubino, se se tratar de concubinato impuro (...). - A de que a concubina não tem direito à indenização por morte do amante em desastre ou acidente (...). Assim, para Dias (2005, p. 180): Quem mantém relacionamento concomitante com duas pessoas sai premiado. O infiel, o desleal permanece com a titularidade patrimonial, além de ser desonerado da obrigação de sustento de quem lhe dedicou a vida, mesmo sabendo da desonestidade do parceiro. Dessa forma, considerando que a união concubinária é formada por uma convivência constante e prolongada, com o impedimento do matrimônio, conforme verificado no item 2.5, constata-se que a única pessoa beneficiária na relação é o concubino, que permanece com seu patrimônio intacto, não tendo qualquer obrigação com a concubina no âmbito do Direito de Família e Sucessores. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 38 A única forma de receber algo desta união é se houver o reconhecimento de uma sociedade de fato no âmbito do Direito das Obrigações com a partilha de bens adquiridos na sua vigência, caso restar comprovada a participação na sua aquisição. Diante disso, conclui a autora: “a Justiça está favorecendo e incentivando a infidelidade e o adultério!” (DIAS, 2005, p. 180). 3.2 A união estável e seus efeitos jurídicos Nos últimos anos, houve uma evolução no ordenamento jurídico ao tratar da união estável, uma vez que as disposições da lei, válidas para os casados civilmente, foram interpretadas e adaptadas segundo a realidade dos relacionamentos a dois da vida atual. Com isso, o conceito de concubina, companheira, amante ou convivente passou a ter o mesmo significado de esposa, sendo assegurado àquela todos os direitos previstos no Código Civil (COSTA JÚNIOR, 1999). De acordo com o mencionado autor, antes da sua previsão legal, as uniões estáveis eram vistas como algo à margem da lei, quando não contra a lei, sendo tidas como ilegítimas e pecaminosas. Contudo, com o passar do tempo, os problemas resultantes destas uniões começaram a ser trazidos à Justiça para serem solucionados, contribuindo para seu reconhecimento. O fato é que muitas pessoas optam por uma união informal, parecida com o casamento, para a qual, ao longo do tempo, foram reconhecidos certos direitos. Segundo Oliveira (2008), o marco desse reconhecimento operou-se com a CF/1988, que no artigo 226, reconheceu também a entidade familiar da união estável. O Código Civil de 1916 não reconhecia os efeitos jurídicos das relações familiares que transcorriam fora do matrimônio. Porém, “jurisprudência e doutrina adequaram-se à nova realidade social, reconhecendo certos direitos às pessoas que optavam por essas uniões, outorgando efeitos jurídicos aos chamados “concubinatos””. Esta era a denominação dada à união informal entre homem e B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 39 mulher que vivessem como se casados fossem, sendo que a CF/1988 veio denominar união estável. (CHANAN, 2007, p. 63-64) Com efeito, passou-se a conceder à companheira, os mesmos direitos que anteriormente só eram assegurados à esposa, entre eles o da reserva de bens em inventário, a nomeação como inventariante, a separação de corpos com direito a permanecer no imóvel comum, alimentos e a proteção possessória quando do falecimento do companheiro ou sua saída do lar. (COSTA JÚNIOR, 1999) Além disso, expõe que o novo regime jurídico da união estável criou responsabilidades para os conviventes, repercutindo em seu patrimônio, como incluir entre os deveres recíprocos, o de assistência moral e material, e criar um condomínio quanto aos bens, móveis ou imóveis, adquiridos onerosamente durante o curso do relacionamento por um ou ambos os companheiros. O artigo 1.723 do CC define: “é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”. Conforme Rizzardo (2007), a lei não exige mais um prazo determinado quanto à duração da convivência. Contudo, a relação tem que ser consolidada, apresentando-se como uma unidade familiar firme e duradoura. No caso, não será reconhecida a união estável se ocorrerem os impedimentos do artigo 1521 do CC, com exceção do inciso VI, quando a pessoa casada estiver separada de fato. Assim, se esta comprovar que vive um relacionamento consolidado com o novo companheiro, após a separação de fato, mesmo que não tenha desfeito a sociedade conjugal, resta configurada a união estável. (PEREIRA, 2004) Com relação às causas suspensivas previstas no artigo 1.523 do CC, estas não descaracterizam a união estável, conforme consta expressamente no artigo 1723, § 2º do CC. Contudo, Dias (2005) refere que, mesmo havendo proibição legal, se ocorrer uma das relações impedidas, não é possível dizer que ela não existe: B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 40 O Estado não tem meios de, por exemplo, impedir o estabelecimento de uniões incestuosas entre pais e filhos ou entre irmãos, por mais repulsiva que seja essa possibilidade. Da mesma maneira, não há como impedir uniões estáveis entre sogro e nora; companheiro com a filha da ex- companheira, adotante e o cônjuge do adotado ou, ainda, entre a viúva e o assassino de seu cônjuge, apesar das proibições legais (1.521). Tais relações estão sujeitas à reprovação social e legal, mas, nem por isso, há algum meio capaz de coibir sua formação. Como existem, não há como simplesmente ignorá-las. (p. 170) Para a referida autora, negar a existência em face do impedimento é uma atitude punitiva. Condená-los à invisibilidade gerará irresponsabilidade, ensejando o enriquecimento ilícito. E conclui que, havendo ou não impedimentos para a sua constituição, merecem proteção todas as formas de família, não podendo ser ignorados seus efeitos. Destaca-se ainda que, no artigo 1.724 do CC, estão previstos os deveres dos companheiros de “obediência aos deveres de lealdade, respeito, assistência e guarda, sustento e educação dos filhos”. Contudo, verifica-se que o legislador não integrou aos deveres da união estável a fidelidade, prevista no artigo 1.566, I do CC, como obrigação recíproca entre os cônjuges no casamento. De acordo com Venosa (2003), a união estável se aproxima e se identifica com o casamento em tudo o que diz respeito à responsabilidade dos companheiros em relação à prole e a si próprios. Pereira (2004) refere que, se for interpretar de forma literal, ser fiel é uma obrigação apenas dos cônjuges. E completa que não se justifica dar tratamento diverso, já que a fidelidade é um valor essencial em ambas as relações (casamento ou união estável). Com relação à divisão dos bens, o CC consolidou o que já estabeleciam as leis 8.971/94 e 9.278/96, bem como a doutrina e a jurisprudência. Entretanto, inovou, ao prever expressamente a adoção do regime de comunhão parcial de bens, em seu artigo 1.725. Com isso, eliminou-se do ordenamento jurídico a expressão “esforço comum”. (PEREIRA, 2001) No regime da comunhão parcial de bens, previsto nos artigos 1.658 a 1.666, todos os bens adquiridos durante o relacionamento são considerados fruto B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 41 do trabalho comum, adquiridos por colaboração de ambos, passando a pertencer ao casal em partes iguais. Portanto, mesmo que um dos companheiros adquira um bem e o coloque apenas em seu nome, este é de propriedade de ambos, pois a presunção de titularidade no registro não é mais absoluta e o companheiro está patrimonialmente equiparado ao cônjuge. (DIAS, 2005) Diante disso, segundo a autora, no caso de uma dissolução de vínculo, como o bem é de propriedade comum, ocorrerá a partilha por metade. Todavia, ficam ressalvadas as exceções previstas nos artigos 1.659 e 1.661 do CC, ou seja, no caso de bens recebidos por herança, doação ou mediante sub-rogação legal. Acrescenta que, considerando a presunção de comunicabilidade dos bens, cabe a quem alega comprovar a exclusão do patrimônio da partilha. Assim, caso um dos companheiros quiser afastar algum dos bens adquiridos na constância da união da divisão terá que comprovar alguma das exceções legais. Também leciona que, a fim de preservar o patrimônio do casal e proteger terceiros de boa-fé, a tendência é reconhecer a ineficácia do ato praticado sem o consentimento do parceiro, preservando a meação deste, no caso de transações com os bens imóveis realizadas por um dos companheiros, mesmo que a lei nada refira acerca disso. A dificuldade está no fato de que, quem vive em união estável não possui identificado seu estado civil, sendo ainda utilizada a identificação de solteiro (a), e isso de acordo com Dias (2005), traz inseguranças e pode causar prejuízos a terceiros que desconheçam a condição de vida com quem realizam o negócio. Diante disso, entende ser necessária a identificação da situação pessoal e patrimonial dos companheiros, a fim de evitar induzir as pessoas a erro e gerar prejuízos ao casal ou a terceiros. Não se pode esquecer ainda que, caso queiram regulamentar o regime patrimonial, os companheiros podem celebrar um contrato de convivência, artigo 1.725 CC, o qual permite várias normas de cunho patrimonial, a exemplo dos pactos antenupciais (VENOSA, 2003). B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 42 Segundo Dias (2005, p. 177), “há a possibilidade de os conviventes, a qualquer tempo (antes, durante, ou mesmo depois de solvida a união), regularem, da forma que lhes aprouver, as questões patrimoniais, agregando, inclusive, efeito retroativo às deliberações”. Dispõe ainda que a faculdade de elaboração de um contrato demonstra a ampla liberdade que tem os companheiros de estipularem tudo o que quiserem, inclusive questões de ordem pessoal. Ressalta que tal documento pode ser uma escritura pública, um escrito particular, levado ou não a registro ou averbação, pacto informal, ou até mesmo disposições ou estipulações esparsas, desde que contenham manifestação bilateral da vontade dos companheiros. Em relação à herança, de acordo com o artigo 1.790 do CC, o companheiro participa, porém, restringindo-se aos “bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável” e nas condições previstas em lei. (PEREIRA, 2004) Dispõe ainda que, no caso de não haver parentes sucessíveis, adota-se solução mais favorável ao companheiro, ou seja, este herdará a totalidade da herança. Já com relação à conversão da união estável em casamento o CC prevê, em seu artigo 1.726, a necessidade de pedido judicial. Mesmo que a CF/1988 recomende, esse procedimento em nada facilita a conversão. Entretanto, para Dias (2005), a transformação acaba não sendo interessante, pois o casamento impõe deveres que não são exigidos na união estável, como o da fidelidade recíproca e o da coabitação. Além do mais, na Lei dos Registros Públicos, há autorização à mulher averbar o sobrenome do companheiro, sem prejuízo dos apelidos próprios da família. Contudo, Dias (2005), ressalta que não se pode afrontar o princípio da igualdade, por isso entende que qualquer dos companheiros pode adotar o nome do outro. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 43 Ainda, poderão os conviventes ou seus herdeiros, tanto durante ou após o término do relacionamento, propor uma ação declaratória, com fulcro no artigo 4º, I e II, e parágrafo único, do CPC, a fim de ver reconhecida a união estável. Também poderão propor uma ação de justificação, prevista no artigo 861 do CPC, a qual tem servido para comprovar a união, especialmente para dirimir questões previdenciárias. (PEREIRA, 2001) Destaca que com o término da relação, os companheiros poderão valer-se de ação judicial para versar sobre os pontos da separação, como: bens, guarda/visitação aos filhos, alimentos à prole e entre os companheiros e até o sobrenome da companheira, denominada dissolução de união estável. Segundo Dias (2005), é inadequado nominar a ação de dissolução de união estável, pois, quando as partes vêm a juízo, a união já está dissolvida. Assim, entende ser devida a utilização de ação declaratória, onde será estipulado o período de convivência em face dos efeitos patrimoniais, bem como serão dirimidos os demais pontos. De acordo com essa autora, com o término do relacionamento, é possível aos companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem, conforme artigo 1.694 do CC. Venosa (2003, p. 61) refere que “essas disposições estão longe de estarem isentas de dúvidas e requererão intenso trabalho interpretativo e jurisprudencial”. Assim, como tudo no direito, verifica-se que sempre haverá divergências a serem solucionadas pelo poder judiciário. 3.3 Concubinato x união estável Segundo Oliveira (2008, p. 150), a “união concubinária entre homem e mulher, tipicamente informal, precedeu historicamente à constituição de família solenizada pelo casamento civil ou religioso com efeitos civis”. Para ele: (...) com a evolução dos costumes e a maior complexidade das relações sociais, deu-se a regulamentação, pelo Estado, da convivência humana, seja pela celebração do casamento, seja pelo reconhecimento oficial da B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 44 união estável, em figurino renovado do concubinato, como forma de instituição da entidade familiar. (OLIVEIRA, 2008, p. 150) Pereira (2001) refere que, na linguagem jurídica, a palavra concubinato é muito utilizada e entende que ela é a que melhor traduz uma forma de vida entre homem e mulher, inclusive com conseqüências patrimoniais. Contudo, para ele, pelo fato de pesar um certo preconceito sobre a palavra concubinato, o legislador quis com a CF/1988, substituí-la pela expressão união estável. Chanan (2007) dispõe que a união estável reconhecida pela CF/1988 é o anteriormente denominado concubinato puro, no qual há a convivência duradoura entre homem e mulher, que vivem juntos como se fossem casados, não unidos pelo matrimônio e que não apresentam impedimentos matrimoniais. Segundo o autor, há o concubinato no caso de convivência, com demonstração clara de afetividade entre pessoas de sexos diferentes,17 mas que estão impedidas de contraírem matrimônio. E é isso que diferencia a união estável (concubinato puro) do concubinato adulterino (impuro), já que o primeiro é formado por um homem e uma mulher,18 desimpedidos, aptos a contraírem o matrimônio, que constituem uma convivência pública, contínua e duradoura (Wolf, 2004), enquanto neste último, há uma relação não eventual, entre pessoas impedidas de casar, conforme previsão do art. 1.521 do CC (OLIVEIRA, 2008). Assim, de acordo com Pereira (2007, p. 198), “Os concubinos, pelo menos pelo que consta do texto legal e consoante doutrina dominante, não têm alimentos, não têm participação automática na metade dos bens adquiridos onerosamente durante a convivência e não podem herdar”. E completa que, se não fosse assim, o legislador não teria feito a diferenciação entre a união estável e o concubinato, previstos no CC nos artigos 1.723, caput e 1.727, respectivamente. Mas admite que a jurisprudência já vem se posicionando de forma diversa a esse 17 Decisões do STJ vêm declarando que a lei não impede a união entre pessoas do mesmo sexo, e desta forma devem ser reconhecidas como uniões estáveis. Nesse sentido restou decidido no REsp. 820.475 – RJ. 18 Considerando que as uniões homoafetivas não foram excluídas da abrangência legal, há decisões do STJ reconhecendo por analogia a relação homoafetiva como união estável. AgRg 971.466 – SP. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 45 entendimento, garantindo certos direitos às concubinas que não estão previstos na legislação. 3.3.1 Concubinato puro ou não-adulterino e impuro ou adulterino Chanan (2007) refere que, com a CF/1988, a doutrina e a jurisprudência passaram a distinguir o que seria o concubinato puro e impuro. Matielo (1997) diz sobre o assunto: Em sentido estrito, o concubinato assume as exatas feições de união estável como concebida pela legislação protetora. Destarte há sinonímia na referência às duas expressões, sendo igualmente elucidativo denominar de concubinato puro a relação adaptada aos parâmetros especificados como pertinentes ao concubinato stricto sensu, em contrapartida à modalidade impura, que se evidencia em determinadas situações enquadráveis na classificação do instituto sob o prisma ampliativo. Ainda, segundo o autor, o concubinato puro é o que recebe o amparo legal. Portanto, este é o concubinato que foi convertido em união estável, previsto no artigo 226 da CF/1988. Azevedo apud Wolf (2004, p. 176) retrata a principal diferenciação entre eles: [...] consiste na existência ou não de impedimento matrimonial ou circunstancial, pois, o concubinato puro se dá quando se constitui a família de fato, sem qualquer detrimento da família legítima ou de outra família de fato e o concubinato impuro ocorre se for adulterino, incestuoso ou desleal, como, respectivamente, o de um homem casado, que mantenha, paralelamente a seu lar, outro de fato; o de um pai com a sua filha; e o de um concubino formando um outro concubinato. Portanto, para o referido autor, uma relação de concubinato adulterino (impuro) jamais poderá ser confundida com a união estável, pois estão presentes os impedimentos do artigo 1.521 do CC, como demonstra o artigo 1.723, § 1º, do mesmo diploma legal. No próximo capítulo será analisada a pensão previdenciária por morte: seu conceito, previsão legal e requisitos. Ainda, será abordada a evolução do direito à pensão à companheira. Por fim, será analisada a jurisprudência e o direito da concubina receber este benefício. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 46 4 A PENSÃO POR MORTE E A CONCUBINA Na análise da (im)possibilidade de a concubina vir a ser beneficiária de pensão por morte de seu parceiro, impede a elucidação de alguns tópicos. Primeiramente, deve-se conceituar a pensão previdenciária por morte e, na sequência, será examinada a previsão legal e os requisitos para recebimento do referido benefício. Além disso, será observada a evolução da legislação no que diz respeito à companheira ser reconhecida como beneficiária. Ao final, será feita uma análise da jurisprudência, que está reconhecendo o direito da concubina de receber a pensão previdenciária, por morte. 4.1 Conceito de pensão por morte Rocha, Junior (2008, p. 289), definem pensão por morte: A pensão é o benefício previdenciário devido ao conjunto dos dependentes do segurado falecido – a chamada família previdenciária – no exercício de sua atividade ou não (neste caso, desde que mantida a qualidade de segurado), ou, ainda, quando ele já se encontrava em percepção de aposentadoria. Segundo os autores, este benefício é ininterrupto, pago aos dependentes do de cujus, a fim de tentar minorar a falta daquele que provinha o seu sustento. Para Martinez (2003, p. 480), “Pensão por morte é um benefício de pagamento continuado, substituidor da remuneração do segurado falecido (provedor), devido aos seus dependentes”. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 47 4.2 Previsão legal e requisitos Inicialmente, é importante consignar que a proteção decorrente da previdência social não se restringe apenas aos vínculos de família, mas sim de dependência econômica, pois, mesmo não havendo mais o vínculo familiar, se persistir a dependência econômica para fins de subsistência, fica assegurado o direito à percepção de benefício previdenciário, como ocorre no caso da ex-esposa que recebe a pensão alimentícia. (AZEVEDO; PIRES, 2008) A Lei 8.213/91,19 em seu artigo 74, define quando é devida a pensão por morte: Artigo 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data: I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste; II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior; III - da decisão judicial, no caso de morte presumida. O pagamento deste benefício também está previsto na CF/1988, que dispõe em seu artigo 201, V: Artigo 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: (...) V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º. O artigo 16 da Lei 8.213/91, ratificado pelo Decreto 3.048/99, prevê o rol de dependentes20 que serão beneficiários do segurado, inclusive, quando de seu falecimento: Artigo 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; II - os pais; 19 Lei que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social. 20 O rol do artigo 16 da Lei 8.213/1991 é taxativo, uma vez que quem não constar nele não será considerado dependente para fins previdenciários, ainda que dependa de fato do segurado. (Rocha; Junior, 2008) B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 48 III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; IV - (Revogado pela Lei nº 9.032, de 1995) § 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes. § 2º O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento. § 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do artigo 226 da Constituição Federal. § 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada. De acordo com Azevedo; Pires (2008), os dependentes vinculam-se à Previdência Social devido à ligação que o segurado mantém com aqueles e com esta. Com a morte deste segurado, surge o vínculo previdenciário entre o dependente e a Previdência, que pode ser considerado como pessoal. Para recebimento do benefício por parte do dependente, não é necessária a carência,21 mas é indispensável que se comprove que o de cujus possua a qualidade de segurado.22 (ROCHA; JUNIOR, 2008) De acordo com o artigo 75 da Lei 8.213/1991, o valor do benefício será cem por cento do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela que teria direito caso estivesse aposentado por invalidez na correta data do seu falecimento.23 Além do mais, a fim de agilizar a prestação previdenciária, o legislador, no artigo 76 do referido diploma legal, coibiu que fosse retardada a concessão do benefício pela falta de habilitação de outros possíveis dependentes. As inscrições 21 Segundo o artigo 24 da Lei 8.213/1991: “Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências”. 22 O artigo 102, § 2º da Lei 8.213/1991 dispõe: A perda da qualidade de segurado importa em caducidade dos direitos inerentes a essa qualidade. (...) § 2º Não será concedida pensão por morte aos dependentes do segurado que falecer após a perda desta qualidade, nos termos do artigo 15 desta Lei, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria na forma do parágrafo anterior. 23 Dispõe o artigo 33 da Lei 8.213/1991: “A renda mensal do benefício de prestação continuada que substituir o salário-de-contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado não terá valor inferior ao do salário-mínimo, nem superior ao do limite máximo do salário-de-contribuição, ressalvado o disposto no artigo 45 desta Lei”. B D U – B ib lio te ca D ig ita l d a U N IV AT E S (h tt p: //w w w .u ni va te s.b r/ bd u) 49 ou habilitações posteriores que se refiram à exclusão ou inclusão de dependentes somente produzirão efeitos a partir da data em que estas forem realizadas. (PAIXÃO, 1999) No caso de cônjuge divorciado ou separado judicialmente, ou de fato, se recebia pensão alimentícia, concorrerá com os demais dependentes para recebimento do benefício, conforme dispõe o artigo 76, § 2º da Lei 8.213/1991. Segundo Azevedo; Pires (2008), para qualificar o cônjuge separado ou divorciado como dependente, é imprescindível que ele efetivamente perceba a pensão alimentícia na data do fato gerador do benefício, ou seja, do óbito. Dispõe ainda a legislação previdenciária, em seu artigo 77, que, havendo mais de um pensionista, o benefício será dividido entre todos, em partes iguais. Segundo Rocha; Junior (2008), nestes casos é possível que cada cota parte seja inferior ao salário-mínimo, sem, contudo, ferir o preceito constitucional que veda a concessão de benefício previdenciário com valor inferior ao mínimo. Ainda, refere que, no caso de haver a cessação24 do pagamento a um dos de